sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Justiça ou Justiça Histórica?




Entre a esperança e a condenação, por justiça histórica, é preferível que a justiça histórica não exista, e que exista o respeito pela ilusão alheia; ainda que esta ilusão venha entremeada de sensores tortos... há que se pensar que, mais que ser um censor, deveríamos criar um universo de liberdade espiritual e sentimental.

Por outro lado, do ponto de vista da vida, é preferível que a esperança e a ilusão aconteça a todos, sem quaisquer retardos de censores. Resta saber, pois, de que forma dá para se pensar em justiça sem matar as esperanças. Ou ainda, pensar em esperanças sem que a justiça (e não a justiça histórica) seja deixada de lado, ao menos como ponto de referência, para uma possível averbação.

Em se pensando a justiça como uma senhora fria e cega, fica-se com a esperança e a ilusão de que sua cegueira não mate os sentimentos do pensamento vivo e vibrante (qualquer tentativa de fazê-lo, por si só, cria uma sensação de morte), este mesmo que é tão volúvel e, ao mesmo tempo, extremamente lascivo. Não quero, pois que a ilusão tenha um caminho torto, visto que os sentimentos humanos acabam necessitando de um limite, principalmente quando sabemos que este sentimento esteja travestido de valores; valores de outrora, valores criados pela poeira do tempo. Mas, acima disso, caso a lascívia ainda esteja por perto, melhor seria se ela pudesse intensificar nossas relações com os pensamentos e saberes de outrora.

Relacionarmo-nos com estes saberes pode nos colocar dentro do liame entre justiça e justiça dos homens (ou mesmo, noutro nome; justiça histórica). A justiça, esta última, é uma ciência fria, criada a partir de preceitos tortos, e são justamente estes preceitos que balizam o julgamento desta lascívia. A história, dessa forma, criou uma justiça com homens de outrora, será que o agora precisa desta passadez, ou necessita da criação de novos valores, logo, uma nova justiça? Este é o ponto que precisa ser pensado para que a justiça não maltrate as ilusões, algumas perdidas, de tempos e valores outros.

Em Da Utilidade e Desvantagem da História Para a Vida, Nietzsche ataca este ponto e nos cobra um posicionamento a respeito, fazendo-nos pensar um pouquinho sobre como o caminho se desviou. Algo que não deixe incólume os rigores da justiça humana, aliás, da justiça histórica; vejamos: O sentido histórico, quando reina irrefreado e traz todas as suas consequências, erradica o futuro, porque destrói as ilusões e retira às coisas sua atmosfera, somente na qual elas podem viver. A justiça histórica, mesmo quando é exercida efetivamente e em intenção pura, é uma virtude pavorosa, porque sempre solapa o que é vivo e o faz cair: seu julgamento é sempre uma condenação à morte. (§ 7)

O quê, então, há de tão pavoroso nessa justiça histórica? Simples, o fato de a mesma se basear em rigores constituídos valorativamente pelo tempo histórico, logo, pelo tempo forjado pelos homens de Lei, retirando dos homens de agora toda possibilidade de um outro futuro mais vibrante. Assim, a Tábua de Leis que dá respaldo a esta justiça é a mesma que obriga os valores e sentimentos humanos a se encaixarem na frieza da regra e na pequenez do tempo passado.

Se o sentimento tem algo de anelo, algo de fogoso, e até vibrante, suas ilusões podem carregar esta chama, o problema maior é você derrubar este anelo e apagar a chama, tirando do conhecimento toda sua persuasão vital, daí deveríamos encarar esta chama como algo que se encontra além da justiça histórica e ao alcance dos homens vivos e apaixonados... apaixonados pelo que a vida ainda tem a oferecer ao sentimento.

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