quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Ai...!, Que Saudades de Minas...


Buscar o esquecimento para não morrer de saudades pode ser o melhor caminho para atingir alguma coisa (ou coisa nenhuma, sei lá... ninguém sabe o que se passa na cabeça das pessoas, apenas sabemos que algumas pensam), todavia, o que seria de nós sem a saudade, de nossa vida, deixasse de fazer parte?

Não sei, nem ouso a perguntar, no entanto, ouso a responder: minha vida passou a fazer sentido quando deixei de lado todo e qualquer resquício de meta... sei lá, essa coisa de firmar compromisso com o futuro parece coisa de pacto com o Além... quem sabe não seja isso que nos falta, não é mesmo, afinal de contas; a saudade é a falta de alguma coisa que já tivemos, seja ela qual for...!

Já tivemos, não aproveitamos e da falta nos envolvemos... sinto falta. Falta de fazer diferente, ou quem sabe, fazer igual,uma vez que a saudade faz parte de algo já feito... um absurdo! É isso, somos deuses, podemos cuidar daquilo que Deus se encarrega (suicídio), podemos ser deuses de nossos desejos... mas, ainda humanos! Afinal de contas, da saudade ninguém dá conta... eira sem beira!

Deixe estar, ainda posso carregar pedras morro acima, é isso que me faz um humano Deus...

Deuses somos quando de Deus nos despreocupamos... ai que saudades de Minas!!!!

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Devaneios Orgásmicos


"Tem merda na calçada, toda a rua está tomada de água, o barco que passava por ali afundou na esquina de baixo. Mas, no entanto, a merda continua sobre a calçada, usurpando a liberdade dos pés das pessoas.


 

"Não imagina o quanto isso é sujo... o homem é sujo, todavia pisa na merda. Seu pé se rebela, os cus se embriagam de prazer... felicidade pros cus, tristeza pros pés. Até mesmo os flatos de Rubem Fonseca se atiram a esse desatino desordenado de excrementos. Sua copromancia não pode prever o prazer dos homens, o desafogo dos cachorros... mas a rua continua alagada.


 

"Cheio de excremento o homem segue sua rotina, apenas seu olfato aprova seu cu. Dentro do banheiro, admirando a merda boiando no vaso e seu cheiro penetrando no ambiente, embriagando o homem, buscamos nossas origens, profetizamos nosso futuro... espere aí, ele está nu sobre a latrina. Sua privada, testemunha ocular de seu futuro, réu confesso de seus excrementos... mas o odor já chegou na sala de estar, e enquanto isso, ninguém ainda limpou a calçada. Confesso que prefiro a bosta da calçada que o lixo molhado das ruas, após a chuva.


 

"O que acontecerá com o barco, e o banheiro do homem nu, até quando vai esconder seu futuro? Pode parecer absurdo, porém, a copromancia ainda tem muito a nos dizer, nem mesmo eu a conheço direito, contudo, sei o quanto eres útil... pelo menos a calçada permaneceria mais limpa, longe dos olhos molhados dos cachorros, com seus focinhos úmidos e frios, depois da chuva. Não sei, mas acho que cagar é a experiência máxima da liberdade humana.


 

"Somente nossa privada sabe o quanto é bom estar sozinho conosco... um bom livro, o jornal diário: acho que vou pra coluna de política... No Congresso Nacional... O alívio de um intestino bem resolvido... só ele é capaz (junto com a privada, é claro) de expressar os limites de nossa liberdade, mas cadê o papel?"


 

Somente aí Albertina se lembrou do que estava fazendo no banheiro após uma refeição mal resolvida. Seus devaneios ultrapassaram a noção da normalidade. Sua vida em absurdo não consegue se conter, mas a mente processa vinte e quatro horas seus delírios.


 

Todavia, não foi só aquela refeição à beira da praia, foi também aquele chá de cedo.


 

O tempo, lá fora, pode passar, mas Tina continua dentro do banheiro, sobre a privada. Nestes momentos nada interrompe seus desatinos... nem mesmo a merda da calçada.


 

"Precisamos fazer alguma coisa, se esta situação continuar perderemos o barco da calçada... apesar do que, ele já afundou mesmo.


 

"Até nas vidas, melhor preparadas, chega um momento em que o homem desmorona. Seus atos se constróem como um monólogo... o eu e o eu sozinho. Dessa construção o homem tenta atingir o ápice de sua subjetividade... é neste momento que o cu entra em cena, uma força sobre-humana se encarrega de depositar excrementos pelas passarelas do inconsciente.


 

"Sua vida começa a boiar dentro do vaso sanitário do cognoscente... o monólogo se apresenta como reflexo de uma força peristáltica no baixo ventre. Sua explosão sai como um peido... cheira mal mas alivia o intestino. É neste momento que a cena atinge seu momento mais ambíguo, a platéia vaia ao mesmo tempo em que o intestino ovaciona; do lado inverso, a bexiga borrifa um jato quente sobre a água... o mijo se apresenta em cena, acontece o clímax!


 

"O inconsciente subjetivo se apresentou de duas formas concisas e salutares... do monólogo surge o absurdo e da cena o imprevisto... o palco cai e o narrador vai ao chão... Qual futuro, se as pernas vão apodrecer e nos enterrar? Surge a náusea, vem o vômito, e novamente o alívio... apesar das vaias o sorriso vem ao nosso rosto, pegamos o banquinho, subimos de novo no palco e agradecemos a multidão... acho que vou vomitar..."


 

Uma pausa, um borrifo... Tina vomita em todo o azulejo do banheiro, suas vistas se escurecem e por segundos a cortina se descerra. Alguém bate lá fora... um grande silêncio..., ninguém responde e a porta é arrombada... a cena dá nojo, todavia, no fundo, o vômito foi mesmo a melhor coisa a se fazer. O intestino e o estômago estão limpos novamente. Seu corpo é suspenso, suas vestes arrancadas, o sexo exposto... parece úmido e excitado... (in)felizmente, não deu para controlar...


 

Após um banho frio Tina se vê, outra vez, sobre a cama... tudo parece como dantes, a vida volta ao normal; mas a sensação de prazer e devaneios idos (apesar de terem sido inconscientes) ainda está em sua memória... o orgasmo!

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Conhecimento Pensado a Partir de Categorias Correlatas


O saber não existe por si só, ele é uma disposição de um ser que, ao relacionar-se com as "verdades" do mundo, torna-se coerente; e nem sempre compreensível (e muito menos sistematizado), por outro lado, poderíamos estar colocando sua tessitura dentro de uma natureza que se movimenta, ao modo da physis grega.


 

Dessa forma, as noções que dizem respeito aos fundamentos do saber, que do mundo são apreendidos pelo homem, são noções que, em constante fluxo, e como uma rede de informações, "caem" sobre o homem que as re-processa (sem ao menos compreender que forma isso se dá e como isso se dá), alimentando cada vez mais sua limitada condição de ser pensante.


 

Apenas em momentos assim poderíamos dizer que estamos a exercer nossa liberdade de condução cognoscente; condução essa que tem neste movimento da natureza – como se verá mais adiante – uma elucidação que, ao mesmo tempo, se encobre.


 

E é neste re-processar que se dá a assimilação e compreensão, de alguma categoria do saber que disso resulta, justificando ainda mais essa fluidez que o mesmo pode se mostrar se, todavia, deixar-se revelar por completo.


 

Esta situação de re-processamento, em contrapartida, não é assimilada por todos da mesma forma. Há aqueles que, devido sua disposição ao saber, e ao querer-mais do saber, a recebem de forma mais efetiva. Há também aqueles que – apesar de terem esta disposição –, por não a terem como algo a ser seguido, acabam nem tendo noção destes preceitos. Situação que não impede o fluxo de deixar de existir. Há ainda os quie nem sabem que o mesmo existe.


 

Ademais, toda construção do conhecimento deve partir de algo, não de forma criacionista como afirma o sistema moral cristão, mas de um embate, e para tal não há que voltar ao início dos tempos, muito pelo contrário, apenas o primeiro momento existe como alguma coisa Universal, por isso sua necessidade de se ocultar em determinados momentos.


 

O que não significa que todos, universalmente, desenvolvam esta predisposição, porquanto, mesmo sem a desenvolver, ainda assim este saber, e sua natureza essencial ainda estão aí, e continuam existindo.


 

O aposteriori deste saber é pensado aqui como a experiência, e o desvelar do mesmo perante os signos que nos são visíveis – enquanto espécies pensantes que somos –, com efeito, quando por experiência entende-se que: tudo aquilo que há em nós de referência conceitual, e que serve de instrumental para o processamento destas informações.


 

A partir deste momento, o que torna-se um imbróglio para o conhecer dos fundamentos do conhecimento não está, necessariamente, no pensamento do ser enquanto "objeto" parado, mas no movimento que esta experiência acarreta no indivíduo, por isso a importância em pensar esta natureza de uma forma não-inerte, embora essencial e primeira.


 

E este indivíduo só vai notar este movimento se se inserir no mesmo de uma forma mais incisiva, não permitindo que o fluxo se dê por conta e risco do destino.


 

Em face disso, outra questão que se sobressai a esta discussão é a que diz respeito ao sentido do ser, sem que da compreensão deste sentido façamos uma ontologia torta. E, por isso mesmo, sentido esse pensado como significante, ou seja; a que campo do saber o ser pertence e, principalmente, como este ser torna-se elemento de constituição cognoscente, responsável por significar que signo nos apareça.


 

Guy Van de Beuque (2004: 65) nos afirmará que o sentido do ser pode não ser uma matéria da ciência e, como tal, de difícil significação, mas sempre foi, e será, o fundamento e o horizonte que lhe dão o contorno de seus limites – limites que nos são importantes para fazer-nos compreender o local que, hipoteticamente, estamos sondando. E como contorno, jamais núcleo ou centro, sua significação apenas nos advém a partir de seus limites.


 

E, como sabemos, estes limites nos serão dados no contato com a natureza e seus elementos de significação cognoscente; seja por meio da experiência, da empiria, ou por algum sintoma da metafísica.


 

E aqui há uma menção clara ao devir de Heráclito de Efésios, pensado por Olímpio Pimenta, interpretando Nietzsche, ao considerar a crítica da ontologia:


 

Considerando em conjunto a crítica acima esquematizada, fica claro que, para Nietzsche, as expectativas metafísicas em torno da permanência só podem pretender justificar-se na medida em que se reconheçam como negócio exclusivamente. Assim interpretadas, não são substrato, princípio ou sustentáculo de qualquer realidade, mas, diferentemente, são marcas da relação do homem com o mundo, sintomas de um tipo especial de leitura ou apropriação das coisas efetuadas em função de impulsos e interesses particulares da espécie. Sua conexão com a verdade depende de seu proveito vital, de seu valor ou não para a vida dos grupos que as instrumentalizaram nos trabalhos inerentes à sua existência concreta. (1999: 37)


 

Razão e metafísica, nesse contexto, têm uma proximidade muito grande, desde que não haja uma interferência externa, ou seja, advinda da experiência. Mesmo porque, pretender pensar esta natureza, ou mesmo este ser como a algo permanente, em justa medida, é comprometer o real núcleo deste conhecimento. Se, por um lado, apenas o vemos dentro de seu limite, aliás, apenas o vemos em seu limite, o compreendê-lo dentro de uma ontologia inerte, ainda mais, torna-se mero sistematizar. Daí a preocupação em pensar isso amparado na razão e na metafísica – e não somente.


 

Afirmação essa que não significa que este saber esteja totalmente amparado na razão, ou tão-somente na metafísica, mas nesta, ou naquela, e nos sentidos, isto é, também nos instintos (talvez aqui a noção de inato tenha uma re-significação, visto que, por inato seria, justamente, penso eu, uma natureza subjetiva que está no homem, e advém dele a partir de certos impulsos ou reflexos).


 

O grande problema que a modernidade trouxera fora a preterição do instinto para a consecução do saber, ou ainda, pensando no romantismo francês (Rousseau) e alemão (Goethe e Schiller, por exemplo), a preterição da razão em detrimento do instinto. A partir do momento que um ou o outro fora preterido, de forma automática, tiramos um elemento a mais que nos ajudaria a compreender a natureza do saber, automaticamente, a natureza do ser que deste saber se apropria para nos significar algo. Daí a importância em se pensar ambos, em constante fluxo e embate.


 

A própria natureza do ser, pensada desde o elemento heraclítico, nos dá uma outra significação destes signos, pois Heráclito não separa um elemento do outro, mas complementa um com o outro; e deste conflito harmoniza ambos elementos.


 

Van de Beuque (2004: 65), ainda insistindo na natureza do ser, tentará avançar sua meditação sobre este problema, tentando aprofundar no que Heráclito denominou de movimento geral da natureza. E que pode ser muito útil para conseguirmos compreender o conhecimento para além de métodos racionais, ou somente instintivos.


 

No fragmento 123 de Heráclito temos a seguinte assertiva: physis kryptesthai phileî, ou seja, a natureza ama ocultar-se e, fazendo isso, o surgir acaba encobrindo o ser, dando aos homens, que deste saber tentam se apropriar, apenas um limite, ou talvez, aquilo que este ser não seria.


 

O fragmento completo seria, segundo Temístio em Oratio (V, p.69), e que fora compilado por Alexandre Costa, é o seguinte:


 

Talvez não seja jamais agradável ao deus que surja consonância entre os homens. "Natureza", [diz] Heráclito, "ama ocultar-se" e mais ainda a natureza do criador da natureza – que por isso especialmente honramos e admiramos –, pois o conhecimento dele não está à mão e nem se alça à superfície, e nem pode ser apreendido sem suor "ou apenas com uma das mãos". (COSTA, 2002: 187)


 

É claro que esta interpretação nos dá uma noção de aproximação com algum ser divino, ou mesmo um certo deus. Em contrapartida, e ainda seguindo a trilha deixada por Van de Beuque, nos é passada a seguinte interpretação: o fragmento acima se refere à natureza, em seu sentido grego e originário – daí a palavra physis –, sendo vista como um movimento geral, ou mesmo de seu vir-a-ser relacionando-se com o vir-ao-nada. E, dessa relação, a significação do saber.


 

E ainda, é como se Heráclito tivesse apontando o pensamento para a compreensão da natureza mesma do ser, pensada em si mesma, mas não em seu núcleo, mas neste seu ser que se encobre; que poderia ser um núcleo, embora não-inerte, e ainda sem sabermos onde fica seu real lugar. Situação que nos faz se aproximar de Temístio e sua apologização a um certo deus desconhecido.


 

Uma possibilidade de se compreender este elemento significante, e que pode nos aproximar de Kant; é o fato desta physis, ao encobrir-se do mundo enquanto ser essencial, talvez, até ontológico, acaba se mostrando como uma essencialidade do saber.


 

Uma proteção que, pelo afirmado abaixo, evita o alteramento e a contaminação do ser essencial, cabendo à experiência e ao aparecer-se o breve momento de transformação. Visto que a natureza está em constante transformação. Diferente de sua essência que permanece, mantendo-se inalterada e originária. Início e fim do elemento saber.


 

Apesar de nos aparecer em momentos de transformação cognoscente, sua real essência se mantém encoberta, por isso sua importância se dá no âmbito do movimento, jamais da inércia. Apenas no movimento pode o homem se aproximar desta essência.


 

E, aproximando-se da mesma está, automaticamente, criando para si saberes e conceitos que, outrora, não lhe eram tão claros assim, como neste momento de desvelamento do movimento. E não desvelamento do ser.


 

Apenas para reforçar: o ser, ao desvelar-se, está se encobrindo ainda mais.


 

Van de Beuque assevera:


 

E é através desse encobrimento do "puro" brotar que a physis protege a essência do surgimento. "Na inaparência do surgimento repousa a garantia de não se deixar tocar pelo alteramento do que aparece a cada vez." O essencializar originário guarda-se ao abrigo da riqueza e, por estar no abrigo, nunca declina. O puro surgimento "garante e propicia o aparecer, sem, no entanto, cair no âmbito do que aparece". E, para isso, tem que se manter encoberto. (2004: 75)


 

O conhecimento a priori, para Kant, tem algo de intocável (e aqui nos aproximamos da significação de Temístio acerca de Heráclito ou, ao menos, sua interpretação sobre); eu diria, pois e noutra direção, que ele é totalmente palpável e acrescentável – em especial o conhecimento que do mundo e para o mundo nos dispomos. E este conhecimento poderia ser encarado e, determinado, como o limite que, logo acima, Van de Beuque apresentara.


 

Ao contrário de pensá-lo tal como a metafísica, o pensaria como uma inter-relação entre vida e logos (e aqui o logos seria entendido como o Incognoscível, ou mesmo premissa que não tem retorno, nem início, pois ela é por si só; e sempre existiu, estando sempre aí).


 

E este incognoscível, pensado de uma forma mais germinal, de fato, surge como algo a priori, no entanto, não um a priori por si mesmo, e distante, mas um a priori que, entrando em contato com a experiência cognoscível, e seus limites, nos mostra um caminho flúido, e como tal, um a priori intuitivo e instrumental.


 

Não se quer pensar no ser, mas no vir-a-ser, sendo o a priori apenas um ponto de partida e, como tal, necessário a todos, e disposto em todos. Todavia, a partir do momento em que se veja esta ponto de partida dentro de um invólucro aberto, jamais fechado e inerte.


 

Noutra direção, aquilo que poderíamos pensar como alguma coisa inata ao homem, pensado aqui, como uma relação com o a priori, eu diria que este inato é uma espécie de característica primordial e genética (pensando genético do ponto de vista da espécie, não do ponto de vista do indivíduo), a qual dá aos homens uma espécie de instrumento para o conhecer. E não instrumento para o apropriar deste saber.


 

Fazendo uma analogia ao jogo dos contrários de Heráclito; é como se o inato, apesar de sua geneticidade original, estivesse em constante embate com o a priori. Um embate que não tem nada de separação, mas de complementação (daí pensar o embate de forma necessária e, assim, não excludente, mas existente) e, por isso mesmo, necessário para a consecução de nossa assimilação do saber.


 

A integridade que Kant afirma, apenas reforça o caráter intocado do saber e sua inospitalidade, assim como almeja a Tradição. Seria, pois, um temor infundado; como conhecer sem sentir esta força? Uma pergunta intrigante e, ao mesmo tempo, exótica. O ato de conhecer deve ser pensado não em sua integridade, mas em sua integralidade.


 

Ainda Kant, com sua propedêutica da metafísica: conhecimento especulativo da razão, o qual sua posição se eleva acima e à parte, tendo na construção da própria razão o papel de demiurgo, mostrando-lhe que deva ser discípula de si própria e não da experiência, restando à experiência apenas o papel de ser pensada como um objeto de uso, necessário, porém, logo abaixo.


 

Trocando em miúdos, o a priori seria a premissa do saber, já o inato seria uma espécie de disposição ao saber, e que está em todos, entretanto, não seria todos que desta disposição se usufruíssem.


 

É como se existisse um objeto oculto que, baseado no a priori, e tocado pela experiência, traria ao homem uma disposição constante ao saber, ou, como diria Aristóteles no início da Metafísica: todo homem, necessariamente, aspira ao saber... (eu emendando), embora, nem todo homem tenha noção muito clara desta sua tão nobre aspiração.


 

Referência Bibliográfica

BERGE, Damião (1969). O Logos Heraclítico: introdução ao estudo dos fragmentos. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro/MEC.

BEUQUE, Van de (2004). Experiência do Nada como Princípio do Mundo. Rio de Janeiro: Mauad/Faperj.

COSTA, Alexandre (2002). Heráclito: fragmentos contextualizados. Rio de Janeiro: Difel.

KANT, Immanuel (2005). Crítica da Razão Pura. São Paulo: Martin Claret.

NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm (2002). A Filosofia na Idade Trágica dos Gregos. Lisboa: Edições 70.

PIMENTA, Olímpio (1999). A Invenção da Verdade. Belo Horizonte: Editora UFMG.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Da Náusea ao Deciframento do Sagrado


O homem não se mexeu de seu lugar na hierarquia ontológica da natureza, nem tampouco fugiu de seus compromissos com a História – pelo menos deveria ser assim –, por esse motivo deixou gravado em suas obras toda uma sombra ideológico-discursiva (não importando que intenções tinha) de seu ser mais íntimo e consciencial.

Não conseguimos ainda ser totalmente anjos, por mais que assim queiramos, nem completamente bestas selvagens, por mais que nosso instinto assim aja. No entanto, conseguimos, baseado em nossa existência cognoscível – que é nossa consciência íntima e inóspita –, deixar marcas de nossa condição fisio-psicológica nas horas de nosso Tempo.

Continuamos em nosso espaço de atuação, vagando entre o sublime e o terrível, entre as esferas celestes e os abismos mais profundos de nossa biologia animal.

Até mesmo, e portanto, por este tipo de atitude fazer parte de nossa existência, como também ser referendado por este inaudível que, apesar de não compreendermos, sempre nos movimenta. E é isso que dá-nos certeza dessa náusea sartreana, disposta numa existência conturbada e nem um pouco estéril – apesar de, em alguns casos, assim parecer.

Esta relação, encontrada no indizível, é uma tentativa de expressar aquilo que é inaudito e inefável ao ser e sentidos mais racionais do ser humano. A palavra até pode chegar perto deste inaudível, aproximando-se da margem do discurso, sem ser, no entanto, algo absoluto; e isso acontece no patamar do nunca, que é também um verbo divino, porém, advindo da boca humana (verbo humano que se metamorfoseia em verbo divino, daí a impossibilidade de justificações e compreensões).

Não adianta se explicar, explicando a criação, ou mesmo lançar olhares filosóficos ou psicológicos sobre uma determinada obra. O que não significa que a mesma não possa ser pensada como a algo discursivo e, às vezes, intencional (imagino que esta última vertente seria a que mais teria possibilidades de discussão).

Há o não deciframento... talvez a intuição! E essa intuição, talvez, daria pistas para seu deciframento, sem, no entanto, ser vista pela razão e consolidada pelo Verbo. E de Verbo, todos os dias, nosso espírito se infla, colocando-nos um pouco mais além da margem de outrora.

Dentro da forma literária tudo pode ser dito, sem que isso desproteja o discurso, e sem que isso o coloque no patamar de mentira. Quer-se desconstruir este discurso, contudo, sempre haverá um rincão onde ele ainda imperará, não sendo-nos acessível jamais.

Dessa forma, a ficção nasce da experiência e dos fenômenos experimentados, bem como o intento religioso e sagrado desta contextualização. Apenas conhecemos o sagrado quando de seu fenômeno, pois sua linguagem é-nos totalmente estranha – apesar de sensível e quotidiana.

A vida cria mecanismos de cognoscência a partir de sua própria experiência com algo – seja este algo advindo do sagrado ou do mundano. E assim podemos justificar esta proteção, ou até quebrar suas muralhas – prefiro esta última possibilidade.

Apesar de haver uma desconstrução discursiva em algum momento, o que uma pessoa tem a dizer só se acaba no momento em que ela morre, não significando, contudo, que seu discurso pereça conjuntamente.

É quando a vida mostra toda sua plenitude: de tão maravilhosa que é, não há como pôr um ponto final em sua expressão, nem em seu discurso. O sagrado mais uma vez se mostra como a algo infinito, e infindo de possibilidades de se mostrar cada vez mais.

Não há aqui a preocupação com o medo – este mesmo que vem junto da proximidade da morte, todavia, anterior à serenidade –, nem com a angústia das influências. De uma forma ou de outra elas virão!

Há uma extraordinariedade no ordinário de nossa vidinha medíocre, trazendo para a posteridade uma continuação do sagrado – o mesmo que se tenta desconstruir, porém, que ainda aparecerá noutro momento, num outro espaço, e de uma outra forma discursiva.

A relação que o homem tem com o sagrado, desde tempos imemoriais, cria identidades, constrói culturas e sugere uma realidade em comum. E seria esta realidade em comum uma conseqüência do discurso religioso-literário o qual me refiro e que, como proposta, tento compreender.

Vejamos, então, como Marshall Sahlins em Ilhas de História, interpreta esta construção identitária, o que, logo em seguida, tentarei relacioná-la com certa construção dogmática: Agindo a partir de perspectivas diferentes e com poderes sociais diversos para a objetivação de suas interpretações, as pessoas chegam a diferentes conclusões e as sociedades elaboram os consensos, cada qual a sua maneira. A comunicação social é um risco tão grande quanto as referências materiais.

Quer-se uma objetivação das crenças que, por conseguinte, dão corpo a certa realidade comum. São interpretações de pessoas e escritos que dão conclusões de como agir e, às vezes, de como pensar. Esta construção literária é uma construção discursiva bastante contundente, pois dá identidade ao grupo e o habilita a criar vínculos sociais e culturais. É daí que surge a noção de consenso e, por conseguinte, de identificação ética.

E, pensando nisso, a discussão que tento levantar é a de que a construção literário-religiosa é uma discussão baseada no consenso, pois, quer-se com isso dar identidade a certo grupo. E por consenso, podemos entender como este grupo se significa perante o mundo que lhe é estranho e, no entanto, tão familiar e caseiro. E a religião pode ser um instrumento de construção deste mundo, dando-lhe características caseiras e, ao mesmo tempo, tão peculiares – e posterior constatação – identitária e homogeneidade sócio-cultural.

No entanto, algo aqui precisa ficar bem claro. E este algo refere-se ao que Nelson Ascher em Relativismo Cultural e Multiculturalismo denominou de relativismo cultural.

Este relativismo cultural pode contribuir para a autocompreensão da humanidade, uma vez que é baseado nestas constantes diferenças que se cria, também, um consenso. Como pode, também, contribuir para a desconstrução do mesmo consenso.

Em contrapartida, este relativismo vale também para o multiculturalismo caso se limite a um programa pragmático voltado para a redução plausível de entrechoques desnecessários de diferenças desimportantes, ele cumpre uma função cujos méritos não convém menosprezar. Tão logo passa, no entanto, a impor o dogma contraintuitivo e empiricamente inverificável de que as culturas, salvo as suspeitas de sempre, nasceram para o convívio cordial, que suas mútuas dissonâncias se limitam a mal-entendidos facilmente resolúveis, ele se revela como a mais recente encarnação do irrealismo suicida. Tentando compreender melhor este longo fragmento: há aqui uma ressalva para o relativismo cultural, na qual tem-se a preocupação de que haja um reducionismo na forma de lidar com as diferenças culturais encontradas ao longo do caminho.

Ao não se considerar estes entrechoques, cria-se uma unanimidade, desembocando em um consenso de constatação. Caso atinjamos esta constatação, apenas reforçamos a força que certa cultura tem e como esta força nos imporia regras e valores. É o caso, aqui, da cultura cristã. Fortemente baseada numa busca ininterrupta de consenso e na anulação das diferenças. Menospreza-se certos quesitos culturais, distintos do todo cobrado, em consonância com o seu statu quo.

Há sim a cordialidade entre as várias facetas da cultura, não significando, contudo, que esta cordialidade se imponha. A maior cordialidade estaria no reconhecimento da diferença e no convívio com ela.

Pensadas como mal-entendidos, estas diferenças impõem um consenso chucro, determinando o suicídio conceitual da própria cultura, desembocando, em menor grau, na patologização da diferença. Patologização essa que, como uma peste incurável, leva muitos viventes ao túmulo.

E também, acima de tudo, uma realidade comum que interfere, nalguns casos, em certa patologia, dando-lhe um emplasto para sua cura – aqui há a referência com a questão da fé e como a mesma pode curar –, cura essa que se mostra com muito maior força na consolidação de dogmas religiosos.

Enquanto há emplasto para suas dores, o homem continua praticando esta realidade religiosa comum, mesmo sabendo que é uma realidade que não lhe pertence, sendo, então, algo estranho a seu ser. A partir do momento em que a dor some, ou mesmo, ganha novas feições: uma nova busca o homem empreende. É onde encontramos a subjetivação de sua dogmática religiosa.

Este indivíduo se liquida em detrimento de um statu quo que se desdobrara como uma imposição. Tornando-se uma realidade sagrada que, porventura, pode deixar de ser, tornando-se de novo, de uma outra forma, e num outro momento, em novas necessidades. E este sagrado nada tem a ver com aquele da origem seminal humana, mas um sagrado a posteriori, instituído como norma de oficialização de conduta. Valores deixam de ser algo interior, tornando-se algo exterior e coletivo – para não dizer coercitivo, pois, é nesta linha que a a obra de Nietzsche caminha.

domingo, 22 de novembro de 2009

Bem Sei Que Não é Meu...




Bem sei que me ocorre não raro falar das coisas que são melhor e mais precisamente comentadas pelos mestres do ofício. O que escrevo resulta de minhas faculdades naturais e não do que se adquire pelo estudo. E quem apontar algum erro atribuível à minha ignorância não fará grande descoberta, pois não posso dar a outrem garantias acerca do que escrevo, não estando sequer satisfeito comigo mesmo. Quem busca sabedoria, que a busque onde se aloja; não tenho a pretensão de possuí-la. O que aí se encontra é produto de minha fantasia; não viso explicar ou elucidar as coisas que comento, mas tão-somente mostrar-me como sou. Talvez as venha a conhecer a fundo um dia, ou as tenha conhecido, se por acaso andei por onde elas se esclarecem. Mas já não as recordo. Embora seja capaz de tirar proveito do que aprendo, não o retenho na memória: daí não poder assegurar a exatidão de minhas citações. Que se veja nelas, apenas, o grau de meus conhecimentos atuais.


Não se preste atenção à escolha das matérias que discuto, mas tão-somente à maneira por que as trato. E, no que tomo de empréstimo aos outros, vejam unicamente se soube escolher algo capaz de realçar ou apoiar a idéia que desenvolvo, a qual, sim, é sempre minha. Não me inspiro nas citações; valho-me delas para corroborar o que digo e que não sei tão bem expressar, ou por insuficiência da língua ou por fraqueza dos sentidos, não me preocupo com a quantidade e sim com a qualidade das citações. Se houvesse querido tivera reunido o dobro. Provêm todas, ou quase, dos autores antigos [e também dos “novos”] que hão de reconhecer embora não os mencione. Quanto às razões, às comparações e aos argumentos que transplanto para meu jardim, e confundo com os meus, omiti muitas vezes, voluntariamente, o nome dos autores, a fim de pôr um freio nas ousadias desses críticos [já eu procurei as ousadias dos críticos para me ajudarem a falar, também, deles e dos outros] apressados que se espojam nas obras de escritores vivos e escritas na língua de todo mundo, o que dá a quem queira o direito de as atacar e insinuar que planos e idéias sejam tão vulgares quanto o estilo...


Michel de Montaigne
Dos Livros

domingo, 30 de agosto de 2009

Emplasto Brás Cubas...


As luzes da cidade são mesmo imprevisíveis, ainda mais quando estão sob o efeito de alguma chuva fina. A beleza que essas tênues gotas projetam sobre o arcabouço concreto e metálico de formas mortas e, por vezes, sujas, nos hipnotiza, traça-nos uma linha absurda entre o estado de consciência e o inconsciente. São luzes que, como vida, correm diante de nossos olhos... são luzes da cidade, vistas pelo carro em movimento, sob uma noite escura e molhada.


A criação absurda de um romance sem heróis ou vilões..., apenas a reprodução de uma estrutura fria e morta, entretanto, é capaz de abrigar o calor de corpos em movimento, no instante mágico do clímax orgasmical. Como também de corpos inertes, embebidos pelo torpor do tempo, acrescido de algum líquido alcoólico, em dosagens dispensáveis. É essa criação absurda, mas ao mesmo tempo ordinária, que não pode ser glosada pelos romances, ou mesmo libelos, fantásticos ou absurdos. A absurdez da vida não consegue deixar-se retratar pelas mãos estranhas de um corpo, também estranho.


Dentro deste turbilhão de idéias, a cabeça de Tina não se deixa subjugar, tudo passa, porém, tudo vê... a criança que chora ao fundo... a chuva fina que insiste em fustigar a arquitetura mórbida de uma grande cidade... o motor de um carro em velocidade estável... É tão vazia essa paisagem que as vezes o sentimento é de abismo, no entanto, Tina está alegre e, apesar de absorta em seus pensamentos, sorri para os seus.


A busca pueril do esquecimento faz com que Albertina mantenha o delírio temporal ordenado, enrubescendo suas faces com a febre do mundo, aliás, a febre de viver nesse mundo; tal como Nietzsche, busca o esquecimento para não morrer de verdades. Pois, a verdade do mundo é opressora e opera em nossos sentidos uma válvula de efusão; tem-se a consciência de viver em absurdo, achando-se normal. As vezes isso nos oprime, eis o motivo de tentarmos o esquecimento. Talvez ele nos joga em face a este absurdo sem o ver, mantêm nossa consciência ocupada, tentando se lembrar dos fatos, fixa-nos à mente algumas aventuras, tão absurdas quanto, também como válvula de escape à loucura gélida e metálica da cidade fria e morta.


Esse esquecimento pueril faz os homens criarem seus mundos; esforçando-se por imitar e ensaiar a liberdade, não imaginam que é justamente dentro deste absurdo que podem encontrar seu emplasto... como fez um dia, antes de morrer, Brás Cubas, trazendo á memória dos homens de seu tempo, as dores da alma. O Emplasto Brás Cubas, com efeitos anti-hipocondríacos, tinha a valorosa e nobre proposição de aliviar a nossa melancólica humanidade. Seria este, o remédio do século?, único capaz de curar a loucura temporal? Acho que não, o melhor emplasto do mundo ficou clarividente para mim, e imagino, também, que tenha ficado claro para Tina...; o melhor emplasto do mundo é reconhecer a loucura que ele é, embrenhando-se de vez nesse absurdo.


Ao criarmos nossa realidade, adquirimos o rosto da mesma, a ponto de fazer de nossa vida uma imitação desmedida da máscara do absurdo. Bem, são conjecturas, entretanto, aqueles que encararem como proposta... que assim o façam.


Segundo Camus, para o homem absurdo, este estágio de criação, já não se trata de explicar e de resolver, mas de sentir e de descrever. Precisamos aprender a descrever nossa ambição em pensamentos absurdos, porém abertos. Uma vez que nossa máscara vital já tenha assumido o caráter de absurdo, também poderemos usar de nossa vida para a efetivação deste absurdo; eis o emplasto mencionado anteriormente e tão desejado pelo senhor Brás Cubas.


É engraçado..., de todos os pensamentos que partem do absurdo, são poucos os que aí se mantém. Isso pode ser encarado como uma falha do emplasto, no entanto, não é este o caso de Tina, sua imaginação em pessoa é a personificação do absurdo, em um corpo ordinário e simplório. Talvez seja a máscara adentrando a alma, sua imitação é tão perfeita que assume o caráter de realidade existencial.


Todavia, retornando, a grande questão em mérito é o caráter transitório de alguns pensamentos que enveredaram pelo absurdo, o que será que os leva a essa transitoriedade? Serão, talvez, a falta de identificação com o absurdo e, também, a falsa existência da maioria dos homens? Pelo que penso, o raciocínio vago e a futilidade da vida são sintomas inquietantes, porém trágicos, da falsa existência... vivem, entretanto, não sabem disso. Mantém sua liberdade presa à transitoriedade de suas quimeras e vontades. Não têm consciência da força de suas faculdades mentais e de seu intelecto, preferem mediocrizar os grandes anseios da alma. Pode-se dizer que vivem uma vida desgarrada e subserviente.


O existir, para estas pessoas, deixou de significar... por isso elas insignificam... fazem parte das fronteiras entre a angústia e a expansão da alma. A brevidade de tempo por que passa seu espírito, oprime sua vida, vive-se em dissonância com anseios e vontades, ou melhor, auto-oprimem sua liberdade.


É necessário buscar o absurdo, vestir sua máscara, e embrenhar-se neste vale..., a validade da vida começa a existir quando existimos para nós mesmos...


segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Sociedades Maias, Incas e Astecas



Maias
No início do século XVI, quando os espanhóis chegaram na região do atual México, o território era habitado também pelos Maias. Os Maias construíram cidades com Tikal, Copán e Chichén Itzá. Nas cidades havia templos, casas de governantes e sacerdotes, monumentos e praças onde se realização celebrações religiosas. A maior parte da população vivia em pequenas casas fora dos centros urbanos.

A economia Maia era agrícola, eles comercializavam cacau, peles de animais, cerâmicas, tecidos de algodão e objetos feitos de pedras como obsidiana, jade e sílex. O povo pagava tributos aos governantes, trabalhando nas minas, na construção de pirâmides, no cultivo dos campos e na abertura e conservação de estradas.

Tidos como deuses, os governantes eram muito respeitados. Os Maias eram conhecedores de arquitetura, fizeram belíssimos templos e magníficos palácios, tinham também conhecimentos astronômicos e matemáticos. Criaram um calendário e um sistema de escrita bastante edificantes e coesos, e assim puderam registrar os acontecimentos da história do povo que julgavam importante.

Quando os conquistadores espanhóis chegaram ao continente americano, a civilização Maia já tinha perdido seu esplendor.

Incas
Na Cordilheira dos Andes e nas regiões banhadas pelo Oceano Pacífico havia, no início do século XVI, um Império sediado na cidade de Cuzco. Esse território pertence hoje ao Peru, Equador, Bolívia, Chile, Colômbia e Argentina.

O governante Inca era um imperador tido como divindade, ele governava com o auxílio de conselheiros escolhidos entre os membros de sua própria família. Os parentes também ocupavam cargos de prestígio no Império, como o de juízes, sacerdotes, generais e altos funcionários do Estado.

A economia do Império Inca era baseada na agricultura. As lavouras mais importantes eram a batata, o milho, o tomate e o feijão. Os Incas desenvolveram uma técnica de cultivo em terraços, aproveitando as encostas das montanhas andinas.

O Estado era dono de todas as terras, e os camponeses dependiam dele para poder trabalhar. Por isso tinham que pagar tributo em espécie (mercadorias) e em trabalho.

A sociedade Inca não era igualitária. O luxo e a riqueza da elite contrastava com a vida simples da maioria da população.

O Império Inca, assim como o Asteca, era formado por várias aldeias. Por razões de defesa ficavam no alto de montanhas. Esse rico Império despertou a admiração, mas atiçou também a enorme cobiça dos espanhóis.

Astecas
No século XVI, a região centro-sul do México abrigava um conjunto de sociedades (os Astecas). A principal cidade da região era Tenochtitlán. A Cidade do México, atual capital mexicana, foi erguida sobre as ruínas de Tenochtitlán.

Essas cidades eram habitadas por diferentes povos, que falavam diversas línguas, mas tinham em comum as técnicas utilizadas na agricultura, as relações comerciais e as crenças religiosas. Outra característica comum era a cobrança de impostos a partir de guerras e alianças militares. Os derrotados na guerra eram obrigados a pagar impostos aos vencedores em produtos ou em trabalho.

Além da cobrança de impostos também ocorriam guerras por motivos religiosos, nas quais o objetivo era fazer prisioneiros para sacrificar aos deuses. A religião tinha um relevante papel na civilização Asteca. Havia vários deuses, e os Astecas acreditavam que eles garantiriam a sobrevivência do seu povo, por isso a quantidade enorme de sacrifícios. Acreditavam também que os deuses orientavam a decisão do seu chefe supremo. Por isso construíam templos luxuosíssimos, decorados com objetos de ouro e prata, tão-somente para agradá-los. O sacrifício humano de prisioneiros era comum como oferenda aos deuses.

A sociedade Asteca era hierarquizada. A condição social do indivíduo era dada pela sua profissão ou atividade. Eles conheciam um tipo de escrita e criaram u calendário preciso. Eram hábeis artesãos e excelentes construtores. Todavia, foi rapidamente conquistada e dominada pelos espanhóis por volta de 1520.


sábado, 15 de agosto de 2009

Já Aos Sete...



Sobre Tarso...


A vida não é madrasta, é por isso que Augusto e Mátria não escondem de ninguém vossa humilde choupana. O teto, por mais simplório que pareça, constrói uma unidade para aquele casal.


A ordem dos móveis, a coerência da vida... exemplos de unidade familiar, microcosmo de uma célula bela e fértil.


Tal como a terra que aquece e umedece a semente da vida, o teto abriga e consolida a célula familiar. Quando nosso casal de heróis enterrou o primeiro torrão daquele lar, também plantou as bases de uma estrutura familiar proba e correta.


Naquele rincão, a corrupção da cidade não entraria. Um mundo exemplo de bondade e respeito, onde o verdadeiro amor é capaz, eis o mundo que Mátria e Augusto plantaram naquele torrão de terra. Este torrão de terra seria o exemplo... o primeiro de um contexto maior; o contexto do progresso e da união.


E a unidade, sugerida através de bases sólidas e corriqueiras, proporcionaria a criação desta vida. O suor diário, a labuta edificante... um mesmo cosmo de solidez e esperança.


A significação mística de humilde choupana sacralizaria a história daquela família. Servindo de exemplo aos frutos do amor familiar, apresentaria também a sabedoria dos serviços diários. Aprendizado consistente, amparado na sagrada instituição familiar, arma capaz de afastar daquela seara a contaminação do pecado, estruturando uma vida cansativa e suarenta, porém, única responsável pela consolidação da fraternidade humana.


O tempo seria testemunha ocular deste torrão puro e benquisto, e que nenhuma vergonha mundana suje os lençóis amarelecidos de sacro existir. Era obrigação daquele casal não permitir a entrada da desordem e da subversão... os valores cristãos eram os únicos doutores da pureza. O sagrado... carro-chefe da existência.


Unidade e ordem são os sinais do tempo, este infinito e imortal, presidido pelo Ser Supremo do Universo; Deus único que doou Seu filho aos martírios do homem, para libertar a humanidade, permitindo-lhe a redenção, perdida após a maldição de Adão. Já dizia um pensador medieval: Tudo aquilo ajustável à convicção pessoal é pecado, logo, o trabalho deve ser encarado como redenção deste pecado. Se o homem nasce pecador, faz-se mister expurgar do espírito tão grave maledicência, eis porém, o motivo da ressurreição de Cristo... expurgar os pecados da Terra.


No entanto, o homem ainda é muito vil; para que saia dessa vileza de espírito, deve-se dispor, incondicionalmente ao castigo referendado por Deus... o trabalho, se tínhamos tudo e não soubemos dar valor, temos que resgatar nossa sina, uma vez que ela conferirá a liberdade... transpiração e louvor.


Neste espírito de louvores cristãos e orações diuturnas nasce a criança Tarso. Bebê forte e com os mesmos preceitos morais de seu pai. Forte senso de justiça, labor e ordem. Já aos 7 anos de idade acompanhava o pai no roçado, bendita sorte aquela, pois seu pai não teria muitos anos de vida e (a contar daquele dia fatídico), entretanto, a família era volumosa.


Caberia ao jovem Tarso zelar por seus irmãos mais moços. Mesmo em imberbes anos sua presença era indispensável na lida. Muitas bocas, grande responsabilidade e poucos braços.


Mátria, nova chefe da família acompanharia nosso herói até o roçado, enquanto a irmã mais velha (8 anos apenas) cuidaria das outras crianças. Uma vida que surge esguia e uniforme. Uma criança e outras crianças... reflexos da responsabilidade à porta.


Um morte trágica, porém justa... Augusto, pai exemplar, marido honesto, cansado do trabalho fatigante resolvera descansar sob a frondosa gameleira. Tempo fechado... raios e trovões riscando os céus. Uma escuridão momentânea e definitiva, um raio, uma vida... seria castigo? Pode ser, mesmo que o cansaço nos subordine, não podemos largar o labor... um momento de descanso... uma eternidade para descansar..., é a morte sorrateira e justa. Deus e Sua justiça divina, a vida eterna e o paraíso perdido. Finalmente Augusto poderia voltar ao seu mundo... seu verdadeiro mundo, estupidamente arrancado por suas próprias mãos... o Criador chamou a criatura de volta...


Seu ciclo se encerrou!


sábado, 8 de agosto de 2009

Depois de Os Sertões!



PÁDUA LOPES


O dia 15 de agosto de 1909 era domingo. Na cidade do Rio de Janeiro, chuviscava insistentemente e fazia frio. Do Bairro Copacabana, um homem franzino, de tez amorenada, de bigode, saiu cedo de casa. Estava irrequieto, com seu guarda-chuva preto. Passou em casa da tia Carolina para pedir aos primos Nestor e Arnaldo um revólver emprestado. Seria para "matar um cão hidrófobo que está rondando minha casa", explicou, ao receber o Smith & Wesson, calibre 22, que meteu rápido no bolso do paletó. Dirigiu-se à Estação Central, comprando o bilhete de ida e volta para a Estação da Piedade. Lá saltou e saiu indagando a esmo, onde moravam dois tenentes, que eram irmãos. Não foi difícil encontrar quem soubesse o endereço. Os irmãos eram bastante conhecidos no local, por serem atletas esportivos. Dilermando de Assis ganhara o título de campeão de esgrima e de tiro ao alvo; Dinorah era goleiro do Botafogo. Alguém informou: "É ali adiante, na casa nº 214 da Estrada Real de Santa Cruz" (atual Avenida Suburbana).


Para lá, em passo sôfrego, se dirigiu o homem franzino com revólver no bolso. As portas e as janelas da casa ainda estavam fechadas. Pendurou o guarda-chuva preto no portão de ferro da entrada e bateu palmas, fortes. Dinorah foi atendê-lo, abrindo a porta lateral. Ao adentrar, o homem franzino sacou o revólver do bolso e anunciou: "Vim para matar ou morrer!".


Deu três tiros em Dilermando e, depois, três tiros em Dinorah, que tentou contê-lo. A sétima bala falhou. Apesar de ferido, Dilermando desferiu quatro tiros de revólver calibre 32, uma das balas perfurando o pulmão já enfraquecido pela tuberculose do homem franzino, que caiu em agonia. Um médico foi chamado às pressas. Conta-se que, quando chegou, depois de auscultar o corpo estendido na cama, o médico sentenciou: "Este homem está morto". Por curiosidade, indagou:


- Quem era este homem?


- O doutor Euclides da Cunha.O médico espantou-se com a revelação do nome. Procurou certificar-se sobre a identidade da pessoa:


- O autor de Os Sertões?


Era ele mesmo. Assim morreu o autor do mais consagrado livro brasileiro do início do século XX, vítima de uma tragédia amorosa provocada pela infidelidade de sua mulher, Anna da Cunha, conhecida como Sianinha. Dezessete anos mais novo, o amante Dilermando de Assis foi preso no quartel, submetido a júri popular e absolvido do crime por ter prevalecido a tese da legítima defesa. Libertado da prisão, logo no dia seguinte, em 12 de maio de 1911, casou-se com a viúva que se torna a senhora Anna de Assis.


Mas a tragédia não termina. O cadete Euclides da Cunha Filho, o Quidinho, foi incitado por parente e amigos a vingar a morte do pai, cuja honra continuava a ser afrontada com o casamento de sua mãe com o amante matador. Cheio de ódio e precaução, no dia 4 de junho de 1916, com uniforme militar, ele alvejou pelas costas o padastro, quando este consultava o processo de inventário de Euclides da Cunha no Cartório da Vara de Órfãos no Fórum. Quase desfalecendo, o campeão de tiro, também trajando uniforme militar, sacou de sua arma e abateu o enteado vingador com uma bala na cabeça.


Apesar do desespero de mãe, Anna de Assis se colocou ao lado do marido, que conseguiu sobreviver ao ataque. Submetido a Conselho de Guerra, Dilermando de Assis foi absolvido por unanimidade.


Contudo, desde a morte de Quidinho, o casamento não foi mais o mesmo. A vida em comum tumultuou-se e Dilermando de Assis procurou conforto nos braços da jovem Marieta. Descobrindo a infidelidade, Anna saiu de casa com os filhos, para viver na pobreza. Ela, que traíra Euclides, não tolerou a traição de Dilermando e abandonou o antigo amante.


Enredo de novela?


Poderia ser. Mas são fatos históricos que remetem ao acontecimento editorial que fez do diligente engenheiro de obras do governo de São Paulo, que construiu uma ponte metálica na cidade de São José do Rio Pardo, um dos maiores escritores do Brasil.


O livro


Sete anos antes da tragédia da Piedade, em 1902, Euclides da Cunha abalara o meio intelectual do País, com a publicação do livro Os Sertões (Campanha de Canudos), que imediatamente provocou admiração e aplauso.


De um momento para outro, virou celebridade, colhendo elogios gerais, inclusive de críticos exigentes como José Veríssimo e Sílvio Romero. Antes, o autor era vagamente conhecido pelos artigos que publicava no jornal O Estado de S. Paulo. Por causa desses artigos, sempre bem escritos, em 1897, ele fora designado correspondente desse jornal paulista na Guerra de Canudos, travada no interior da Bahia entre o Exército brasileiro e os seguidores do místico cearense Antônio Conselheiro.


A história da campanha militar, a experiência adquirida no contato com o meio agreste e com o sertanejo lhe inspiraram a obra, só que ela transpôs os limites da cobertura jornalística, para se situar numa fronteira entre o ensaio científico e a ficção literária. A obra foi dividida em três partes: "A Terra", "O Homem" e "A Luta", formando uma complexa unidade, com os dois primeiros temas justificando o terceiro. O texto foi surpreendente para seus contemporâneos, vazado em termos técnicos, recheado de palavras arcaicas; uma linguagem barroca, com antíteses, hipérboles e oxímoros, ao lado de descrições vigorosas, coloridas e poéticas. Parte da obra sofreu influência dos preconceitos raciais da época, induzidos pela filosofia determinista. No entanto, excetuado esse conteúdo superado, o livro se preserva extraordinariamente atual.


É preceito que um livro é considerado clássico quando ele admite, com o passar dos anos, interpretação atualizada de sua mensagem. Ou seja, o seu conteúdo é rejuvenescido com as releituras, que encontram nele uma verdade permanente ou uma fonte de sabedoria e beleza. O caso de "Os Sertões" é paradigma desse preceito. O ensaísta José Guilherme Merquior, com sua autoridade na matéria, afirmou que o livro é "o clássico de ciências humanas no Brasil". Como obra sociológica pioneira, descobriu os dois brasis, com as civilizações do litoral (progressista) e do interior (atrasada). Como obra histórica, registrou os erros políticos e militares que levaram o País a uma guerra civil. O estilo refinado da linguagem e a alta qualidade de seu texto lhe conferem lugar destacado como obra literária.


Não encontrando interessados na publicação do seu livro sobre a Campanha de Canudos, Euclides da Cunha pagou do próprio bolso a edição contratada com a casa Laemmert, do Rio de Janeiro. Pronta a impressão, ao fazer a revisão do livro, ficou desesperado com os erros tipográficos. Empreendeu a insana tarefa de emendá-los manualmente, acrescentando o que faltava com tinta de caneta e raspando com canivete o que sobrava no texto impresso de cada exemplar, para assombro e zombaria dos operários da oficina. Somente depois é que autorizou a editora a expor o livro na vitrine.


Sob tanta expectativa, o autor ficou nervoso, porque "tinha certeza" que a obra seria "um desastre". Conforme recordou depois, não aguentando a ansiedade, ele deixou o Rio de Janeiro e foi para a cidade de Lorena (SP), onde residia.


Mal chegou, saiu sem destino, a cavalo, vagando pelo interior de São Paulo, procurando não ver ninguém, esconder-se, para não ter notícia do "desastre" do livro. Ao cabo de oito dias, cansado e com saudade da família, resolveu voltar. Foi para a estação de Taubaté esperar o trem que vinha do Rio de Janeiro. Estava no restaurante quando avistou um passageiro com um livro debaixo do braço. Fixou os olhos no volume meio encoberto e não acreditava no que estava vendo. Num impulso, abordou o desconhecido, pedindo-lhe para mostrar a capa do livro. Era Os Sertões, era a primeira manifestação do sucesso editorial que se mantém há 100 anos.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Seção D'Outro



Fico com medo de dar divulgação a esse tipo de coisa, para não dar idéia pra bandido, mas aí vai. Uma notinha no Estadão dá conta de uma nova “política social” aplicada em Assis, no interior paulista.


A polícia da cidade decidiu utilizar-se do crime de vadiagem, previsto no artigo 59 da Lei de Contravenções Penais. A lei prevê pena de 15 dias a três meses de prisão para o ato de “entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover a própria subsistência mediante ocupação ilícita”.


Em 30 dias, 51 pessoas já foram fichadas pela polícia de Assis e estão sendo monitoradas pela prefeitura – comandada por Ézio Spera, do DEM (espero que o Kassab eo Serra não andem conversando com ele). Elas têm 30 dias para conseguir emprego ou poderão ser presas. Simples, não?


Se fizessem a mesma coisa no país todo, 15,6 milhões de pessoas ou 8,1% da população deveriam estar sob monitoria, segundo a taxa de desemprego do IBGE de julho.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Crônicas de Iniciação...



Quando a luz desceu do céu e começou a freqüentar a vida das pessoas, o universo ganhou uma nova significação. A partir de então, sua contextura adquiriu uma concepção humanizante. Este é o momento onde os homens começaram a enxergar o universo interior que é sua vida, com suas felicidades, tristezas e conflitos. Então, a vida começou a se perder no infinito, sobremaneira, quando era pensada e racionalizada. A única certeza destes homens é a de que, a vida é muito mais que um ciclo insosso e pré-estabelecido.


Junto com o universo, a vida ganhou infinitude, tornou-se possibilidade. Dizem que os homens começaram a ponderar acerca de eventos e pensamentos. Surgiu, aí, o homo sapiens, porém, sua sabedoria começou a ser moldada pela recorrência, assumindo um caráter ordinariamente absurdo. Estamos predispostos ao desconhecido e à surpresa.

Tina, assim que descobriu essa possibilidade, se transformou. Sua vida, outrora vazia e supérflua, tornou-se absurda e ambígua... ela descobrira o elo perdido, descera da árvore e começara a plantar, dominando a natureza e seus instrumentos.



# # #



A porta acabara de se abrir após um longo tempo, recheado de gritos e blasfêmias, os pais de Albertina resolveram apresentar-lhe a situação.

Frederica e Jean, após dez anos de constantes atritos, estavam prestes a tomar a maior decisão de suas vidas e, consequentemente, da vida daquela pobre criança de onze anos. A situação tornara-se insustentável, nem mesmo o patrimônio e sua prestigiosa posição de destaque, acumulado por anos ininterruptos de trabalho, e a inocente presença de Tina (era assim que carinhosamente era chamada pelos pais), eram capazes de, falsamente, manter aquele acordo matrimonial.

A vida daquele jovem casal se transformara mui rapidamente, da noite para o dia uma herança batera à porta deles. Um fato inesperado tirara a vida do avô de Tina... recorrência de uma vida imprevisível, como ele mesmo gostava de ressaltar aos ouvidos inocentes de uma criança.

A falibilidade da vida humana é o fato mais absurdo de nossa existência. Ao mesmo tempo que apresentamos o segredo do genoma humano e a vacina para alguma doença fatídica, não sabemos o devir de nosso tempo. Sabemos, sim, que temos nosso próprio tempo, no entanto, as dobras de nosso existir não nos pertence, apesar de incitarmos nossa consciência à normalidade do pertencimento. Uma vida tão normal, mas, ao mesmo tempo, tão surpreendente. Essa é a centelha da vida de Tina, mesmo sem saber, esta máxima impera em sua vida com uma constância quase empedernida, senão teimosa.

A morte do avô e o desenlace de um matrimônio com bases sólidas, e confiante num futuro de realizações, como de fato aconteceu por algum tempo, eclodira o mecanismo absurdo de uma existência, explodindo a catarse diuturna de Tina. As recorrências de sua absurda vida normal deram a guinada necessária, o mundo se abriu num estado de recorrência... o absurdo passaria a conduzi-la, e a vida... desconduzida. Não existem vítimas nem culpados; o maniqueísmo da vida não pode ser encarado como único fio condutor de nossa existência, o que existe é recorrência de vazio e solidão, como também, recorrência de absurdo e ambíguo.

A vida de Tina fora isso; um ponto inicial com convergência entre o maniqueísmo mecanicista das relações humanas e a recorrência absurda do não pertencimento de uma vida normal. Seu existir consegue convergir com o existir dos homens, porém, estes últimos não conseguem enxergar tal convergência, uma vez que o maniqueísmo mecanicista fixou morada em seu cognoscente.

A notícia de inesperada separação, apesar de trágica para a vida de uma criança, não conseguira tirar Albertina do carrossel que entrastes. Após o falecimento de seu avô – um homem culto, sendo o primeiro educador de Tina e também o primeiro a apresentar a absurdez que é a vida –, nada mais poderia pegar Tina de surpresa. Mesmo porque, após a experiência com os livros, sentira em pelo, os ensinamentos do avô. A estupidez em que morreu... apenas exemplo de uma leitura antiga e altaneira..., pregressa ao tempo do elo perdido. A vida, segundo Wilhelm – seu avô –, era a efetivação da absurdez do universo, sendo assim, o homem não passa de protótipo racional dessa absurdez. Ou talvez, mecanismo de construção do insensato.

Da mesma forma que abriu, a porta se fechara, todavia, Albertina não saíra de sua posição... de seu casulo. Apenas levantara a cabeça para confirmar a recorrência de seu espírito. É fato que possuía tudo aquilo que pedia... só não sabia porque pedia. Seu quarto era a confirmação do maniqueísmo simplista de sua vida, aliás, da vida que seus pais lhe dera. Sendo eles a matriz conformadora deste maniqueísmo, são também a edificação triunfal de uma sombra... a sombra da esfinge de nariz quebrado... altaneira e débil.

A surpresa, minha cara Tina, é se surpreender com o devir, ou melhor, com o futuro... tudo pode ser possível desde que adentremos a este mundo.


# # #



Somos instrumentos; minha querida netinha, não sei se você entende o que estou dizendo, mas quando parardes para refletir sobre isso, poderá me compreender melhor.

É por isso que te digo, os homens, apesar de sapiens, precisam se utilizar melhor dessa faculdade mental. Acho que, ao evitarmos tal faculdade, estamos evitando nossa vida; e nossa vida pode apresentar muito mais que simples paredes em branco. Somos a base de nosso absurdo e a quintessência de nosso saber. Espero que, dentro deste saber, a sua vida seja melhor aproveitada.

Ainda uma criança de oito anos, porém com olhos curiosos e brilhantes. Não é a toa que seu avô começou a se aproximar. Notara nessa criança uma capacidade cognoscente extremamente produtiva, por isso resolvera, pessoalmente, desde os seis anos, apresentá-la ás letras... primeiro com a cartilha, notando que, em pouco tempo, não era mais suficiente para saciar a sua curiosidade, sendo fonte interminável de sentidos, passou para obras mais imponentes, aguçando seus sensores.

Lia-as como se estivesse contando uma estória de fadas e anões. Sentia que a saciedade de seu espírito, cansado e carcomido, poderia ser recompensada e suprida com a aprendizagem dessa garota precoce. Nunca, em sua vida, investira tanto em alguém, nem mesmo com seu filho Jean se envolvera tanto.

No entanto, sabia que Tina era diferente, apesar dos regalos, a menina não se contentaria com isso, somente. E, pelo visto, dera certo... sentira que a semente estava germinando e isso era como sorver o néctar, característico das refeições do Olimpo... Se embriagava com tão doce beberagem. Fustigava seu opositor como quem passeia com um bebê, pela pracinha ensolarada. E seu opositor era seu mundo... que planava sobre suas dores.

Mas vovô, como é que podemos descobrir estes sinais? Se eu sou um instrumento da natureza, qual é o papel do universo nisso? Aquela luz que desceu do céu entrou dentro de mim?

Entrou sim, minha querida, e neste momento a vejo despontar em seus olhos. O brilho que deles emana é tão intenso e belo, que chega a cegar as gastas pupilas de seu avô...

Você não precisa ir muito longe para descobrir esta luz, sua presença é a personificação da mesma, e seus olhos são o caleidoscópio do saber.

Mal sabia, a doce Albertina, que essa seria a última de suas entrevistas com o vovô. Entretanto, só depois dessa entrevista que nossa criança começaria a reconhecer os raios de luz que despontavam de seu espírito, e digo mais, após essa entrevista, mas, personificado no corpo frio de seu avô, dentro do gélido ataúde. Ninguém vira, porém Tina enxergara no corpo gelado do avô, o instrumento iluminado que daí saíra, entrando em seu corpinho moço e puro.

A partir deste momento, essa jovem criança começaria a se maravilhar com a absurda normalidade que é a vida humana.

O momento surpreende mesmo os que o esperam...


terça-feira, 28 de julho de 2009

Poesia


Diário de um daltônico


Eu preciso ver o mundo

O que acontece para além da minha janela trêmula e sem foco

Que é uma sobrancelha que se enruga com o vento

Ou o meu olhar que se envergonha com o seu

Preciso sentir o mundo correr pela estrada a fora

Ver o que eu posso fazer

Conseguir o que eu quero

Mas eu não sei o que eu quero

Nem sei se sei querer

O meu desejo não dura muito tempo

É como um orgasmo precoce, um sorriso sem graça.

O que eu quero é só de vez em quando.

O sorriso da serpente deslizou

Até chegar no seu destino

Não quero o amanhã sem graça de todos os dias

Quero ficar onde estou e ao mesmo tempo sinto vontade de correr

Para todos os lados que meu nariz apontar

Não quero obrigações ou imposições

Quero amanhecer quando puder

Não quero viver a mercê da sociedade,

Dos seus costumes estúpidos

O que eu quero é te ter no meio da rua

Para que todo mundo veja inclusive quem você ama

Quero ser como os cães

Que fazem o que querem e quando querem

Não precisam de ritos para dissimular o que mais desejam

São autênticos.

E é isso que eu quero.

Não quero disfarçar o que penso ou esconder o que sinto

Quero poder dizer qual a cor do meu céu...

Pelo menos é isso que eu quero agora

O antes e o depois eu já não sei

Só existe o agora

O ontem é só lembrança e o amanhã é só sonho

Enquanto não se tornar o hoje.


25/07/91

Poesia




JANELA PARA AS ESTRELAS


Todo mundo deveria ter uma janela para as estrelas.

Às vezes nós dois ficamos tão solitários

Eu não escolhi esse caminho

Eu sempre quis caminhar a beira mar

Sentir as ondas beijar os meus pés

Eu não posso dar-lhe além do que recebo

E o silêncio de seus olhos machuca-me a alma

Seu sorriso é tão doce e tão raro...

E o vento continua a varrer o mundo

Como se nada tivesse acontecido.

1999

Meninos e Meninas e os conflitos da sexualidade



Em tempos de passeata gay, de intolerâncias e violências contra as minorias, é sempre bom lembrar e refletir sobre alguns versos de uma música que fez muito sucesso no final dos anos 80 na voz de Renato Russo da Legião Urbana.


Entre várias letras que falavam de sua condição como homem e gay, Renato Russo em “Meninos e Meninas” se destaca por tocar num conflito que praticamente todos jovens passam, digamos, o ritual de passagem entre a puberdade e a fase adulta, qual seja, a construção da sexualidade, da relação com a família, com os outros de sua idade e com os mais velhos.


A canção narra o conflito entre a formação religiosa da personagem da música narrada em 1ª pessoa, que é proveniente de uma família católica e os sentimentos novos e confusos: o gostar diferente em relação a meninos e meninas e como ser aceito pela família, pela sociedade e, espiritualmente, pela crença religiosa de seus pais, nesse último conflito, como superar o preconceito religioso que insiste em rotular o homossexualismo, ainda hoje (e não se restringe apenas ao catolicismo), como uma anormalidade, uma promiscuidade, enfim, como um pecado.


Como é próprio da modernidade sexista descrita por Foucault em sua trilogia: “História da Sexualidade” em que contestou a tese da repressão sexual de autores como Marcuse, revelando que, para além da repressão, o poder age como incentivador do discurso sexual, modelando, acomodando, fiscalizando, punindo sim, mas, sobretudo, formando regras de conduta baseadas em um saber sexual, com seus dispositivos de poder e verdade.


É sobre essa ótica, a do centralismo sexual, que os adolescentes do Ocidente começam a tatear e a fazer a leitura de mundo, a julgar os colegas e a si mesmo, a condenar certas condutas e a se espelharem em outras, para se formar enquanto indivíduo. É um aprendizado tortuoso, pois, por um lado, são cobrados por todos, acerca de sua conduta ética, julgados, em grande parte, pelo comportamento sexual que adotam e, por outro, se vêem sozinhos, desassistidos e, concomitantemente, direcionados por um discurso de saber sexual que diz a hora, o local e para quem devem se expressar, não certamente, para pessoas da mesma faixa etária.


Além de todo o ensejo para refletirmos, proporcionado pela letra de Renato Russo, há também as ambigüidades, um colega meu diria: a canção é polissêmica, pois a cada nova audição, permite que você a perceba de outra forma, com ênfase em outros aspectos. Nesse sentido, “Meninos e Meninas” transcende os clichês do pop e não pode ser simplesmente descartada, muito pelo contrário, é uma legítima poesia que expressa os anos 80, mas também o ultrapassa em sua temática ainda atual (talvez, os anos 80 também continuem atuais).


Abaixo a intolerância!

domingo, 26 de julho de 2009

Onde Tudo Começa...


Àquela hora da manhã, o silêncio parecia um mal presságio... até mesmo a patrulha assoprava fumaça no ar. Por incrível que pareça, nem mesmo o odor acre da putrefação, incomodava aqueles homens... não sei se por rotina ou mesmo por estranhezas de guerra. A única certeza é a de que, estranhamente, o ambiente parecia festivo.



Ainda assim, o que se nota é um ambiente extremamente hostil. Nem mesmo as roupas utilizadas faziam parte da realidade daqueles homens. Uma sensação de máscara pairava sobre os ares destas terras estrangeiras... seus habitantes, naquele momento, eram estranhos à paisagem. Apesar de serem homens com características físicas, mais ou menos universais, tal universo era como suas roupas... largas e desconfortáveis.


A divertida sensação de estranhamento acometia vários homens, mas um em especial, ainda nem tinha percebido a hostilidade do terreno, importava apenas a curiosidade do momento. E o momento era um sentimento de surpresa e deslumbre, ou ainda, a sensação de plenitude comportamental.



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O palco estava montado e a encenação era perfeita, porém nosso anti-herói não conhecia os fatos. E foram estes fatos o ponto de partida de uma consciência futura. Foram estes fatos que jogaram Edrid ao desconhecido e à surpresa.


Contava então com 18 anos, acabara de sair da casa dos pais, e aquele ato de desobediência psicológica tinha a caracterização de um ritual libertador, mas, ao mesmo tempo, imprevisível. Todavia, fora esta imprevisibilidade que impulsionara aquele jovem de cabelos rebeldes e ar sério, ao local onde se encontrava.


Sem noção de espaço futuro, porém, forte ímpeto de presente, aquela situação ora vivida, significava o enterro de um passado impessoal. Aliás, o enterro de uma vida hostil e sufocante.


Entretanto, o que levou este jovem a sair da companhia dos pais e arriscar-se numa campanha obscura e incerta? Tentarei explicar: desde auroras passadas, esta criança inquieta sentia-se dispersa e fragmentária; mesmo sem saber do que se tratava, a inquietação era para sua vida uma presença constante. Cá em meus pensamentos imagino que, sendo como é, uma partícula do mundo, os homens, devemos ter raízes resistentementes sulcadas na terra, com suas intermináveis ramificações existenciais; as mesmas, permitindo-nos esclarecer nossa ligação intimista e fragmentária com o mundo, esclarecem também a incompatibilidade de vivermos em platôs suspensos...com raízes aéreas, tais como os jardins da lendária Babilônia.


Talvez, este espírito de estranheza seja a premissa de nosso existir. Assim como Edrid, nossa quintessência tem como fundação o inquieto e o suspenso... por isso a necessidade de raízes saldáveis e volumosas... E mesmo nesta fila, onde Edrid confirma o enterro de seu passado impessoal, queiramos ou não, está lançando uma lanterna até seu futuro. Por mais que seja incerto, traz para ele o conforto da surpresa... embora não saiba, é esta surpresa o símbolo fundante de seu ritual, quiçá, sua personalidade. O desenlace dera-se a partir do momento em que o jovem Edrid entrou na fila.


O palco montado, as personagens silenciosas e a fila... tudo recorrência de uma trama incerta e muito bem representada... a encenação perfeita fora o ponto de partida e Edrid o primeiro passo.
"O tempo, segundo uma bela fórmula de Platão, é a imagem móvel da eternidade."



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O momento, definitivamente, é aquilo que nossas sensações criam. Para Edrid, nem o mal cheiro da trincheira à sua frente tirava-lhe seu estupor. A sensualidade daquele ambiente, sua força psicológica... sua ramagem nunca vista antes, enfim, tudo á sua volta era novidade.


Desembarcara no dia anterior; imaginava que aquela fila traria surpresas, contudo, sua expectativa fora superada. Aqueles corpos... vivos e mortos, dividindo o mesmo espaço, apresentando uma estranheza no ar, mostrando um mundo impreciso, porém, ao mesmo tempo impetuoso... a busca do tempo perdido se confirma na perda final. O tempo é móvel, no entanto traz a eternidade, e aqueles corpos confirmam a sistemática do limite... a certeza de nossa falibilidade. Nem mesmo isso fora capaz de arrancar a sensação de Edrid... seu primeiro dia começara bem.


De repente, como que saindo de um sonho, um barulho estrondoso invade os ouvidos de Edrid, um clarão faz suas vistas turvarem por segundos... minutos... horas... dias! A seqüência é apresentada por gritos, novos estrondos, sombras voam sobre sua cabeça e um novo ruído invade seu estado de espírito. A sensação de escuro toma o ambiente, uma dor insuportável o joga no chão, passam-se vultos sobre sua face... As palavras ouvidas começam a se distanciar, neste momento as trevas preenchem sua memória... suas retinas estão opacas e vão se perdendo no infinito... apagão total!



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Foram horas de agonia, paramédicos com armas em punho. Grandes lança-foguetes tentando revidar... o caos em formato de sangue!


A contar do instante em que aconteceu o ataque aéreo até os olhos se abrirem novamente, foram dias.


Mas, antes de enxergar a luz novamente, muita coisa aconteceu...


Aquela sensação de euforia e novidade fora brutalmente interrompida por uma bomba, a perna sendo despedaçada e o sentido da morte se mostrando tanto quanto da vida que acabara de ganhar... e tão belo quanto! Achava que tinha encontrado a liberdade, no entanto, só a possibilidade da dor, tardiamente sentida, fora capaz de mostrar à sua torpe consciência, a farsa daquela dramaturgia oficialesca.


Foram horas de esquecimento, nada se via, nada se sentia... apenas escurecia. A dor não existia mais, era a própria existência. Contudo, não era uma dor física, pois seu corpo se encontrava dormente e ensangüentado... era a dor da alma, da desilusão e da surpresa. A dor que rondava seu espírito era existencial, algo intenso e, por incrível que pareça... libertador! Aliás, a vida era sofrer, era sentir dor. Sensações como essa começavam a se processar na mente adormecida de Edrid. Apesar de dormente, seus pensamentos despontavam, pulavam aos borbotões sobre aquele vazio escuro e estranho. Erigiam castelos de areia... rompiam a normalidade da vida... apenas pensamentos, todavia, com a força hercúlea do assalto e da plenitude... no entanto, apenas dor!


Se um papel em branco aparecesse á frente da consciência de Edrid, em segundos seria como essa página que o leitor aprecia... cheia de letras e signos... símbolos de dor e sofrimento. Eis o suplício, segundo os olhos de Gutenberg, seu legado se confunde com os sentimentos de Edrid.


E nosso anti-herói? Reflexo da encenação oficialesca de uma conjuntura fascista, medíocre e hipócrita... será que acabou?


Para Edrid acabou, trouxe-lhe surpresas, traçando definitivamente as linhas de uma vida em suplício, aliás, de um suplício eterno no formato de vida...