segunda-feira, 19 de março de 2012

Educação Rumo à Virtude



(Segundo Nietzsche) 

Seguindo a trilha da humanidade, é fácil depararmo-nos com sua busca incessante pelo aperfeiçoamento humano, destarte, pela pretensa apreensão de conhecimentos rumo a um código de ética universal, colocando o ser humano no mesmo códice do das leis morais, onde, amparado em seus conhecimentos de mundo, crie-se a si mesmo subsídios para sua emancipação cognoscente.

Partindo dessa premissa, este texto visa traçar algumas informações acerca da ARETE e como  mesma teria sido pensada, há séculos, enquanto subsídio para a Educação rumo à virtude, tendo na Grécia Clássica e em Nietzsche os principais interlocutores.

Pode parecer um trabalho desarmônico, no entanto, quando dispomos de mecanismos conceituais como a paidéia grega e a noção de Übermensh de Nietzsche, a verossimilhança pode se apresentar de forma mais veemente.

Surgida no século IV a.C., a concepção de educação teve em Isócrates e Platão os mais fortes defensores. Ambos viam a educação como a estruturação de um humanismo universal, discussão essa colocada no centro da vida cultural ateniense. Por serem duas visões distintas de humanismo, tinham na concepção ideal de educação a grande divergência.

Para Platão a Matemática e a Dialética seriam o ponto inicial da verdadeira filosofia. A Dialética teria o papel de exprimir uma ciência com método e objeto próprios e a Matemática de separar-se do mundo da experiência e elevar-se ao inteligível.

Isócrates, ao contrário, busca na Retórica e na História este ponto primevo da educação. O discurso seria o único capaz de exprimir o conteúdo ético-político, responsável para a formação dos jovens atenienses, já o estudo da História serviria para adquirir uma grande experiência. Afora, este último acaba contribuindo para a disseminação do humanismo ocidental, chegando até a receber o posto de pai da cultura humanística, uma vez que Platão buscava a Matemática para referendar seu conceito de educação.

Outrossim, o importante a destacar, nesta divergência saudável, é a dialética histórica do ideal de cultura que se desenrola no diálogo entre Isócrates e Platão. Tal diálogo vai encerrar o valor permanente que apresenta o humanismo universal. A paidéia grega tem nestes pensadores a veemente autocrítica do humanismo erudito do ocidente moderno, abrangendo a totalidade dessa abrangência autêntica.

Com efeito, foi o ideal de homem, tal como a ARETE grega que, substancialmente, ocasionou à humanidade sua trilha rumo a emancipação cognoscente, o que lembra a noção de Além-do-Homem (Übermensh) em Nietzsche. A noção de homem, inaugurada pela paidéia grega, congrega uma ideia genérica de homem, na sua validade universal e normativa, ou seja, um homem que tenha sua noção de ética profundamente estruturada no humanismo universal e como tal, senhor de seus atos e vontades.

Ademais, a noção política da ideia grega de homem se afirma em um caráter de autogestão, das necessidades de conservação e do desenvolvimento da própria vida física, sobremaneira, da capacidade de travar relações sociais; estas últimas, amparadas na existência do lógos heraclitiano, transferida aos indivíduos virtuosos.

Segundo Nietzsche, a virtude que o homem deve buscar e que, destarte, é encontrada na modalidade de pensamento dos tempos primitivos, seria a ARETE. Com efeito, esta é a virtude da força e destreza dos guerreiros ou lutadores, sobretudo, no heroísmo da Grécia Trágica (Nietzsche designa como Grécia Trágica a Grécia mítica). Dessa forma, a paidéia busca na ARETE um ponto firme, onde surge à tona o homem e sua formação universal, ademais, uma estrutura cognoscente que direcione o homem rumo à virtude.

A educação, da forma como a paidéia grega apresentava, só tem sentido quando se encara todo o esforço humano. Sua altíssima vontade em criar um destino (e isso lembra o amor fati nietzscheano) era a justificativa última da individualidade humana e seu conhecimento próprio, não há razão em separarmos a ARETE dessa noção homérica, uma vez que, a inteligência clara do homem tem em sua destreza e destemor a corda estendida no abismo de Zarathustra, uma corda que separa o homem do Além-do-Homem.

O humanismo só tem razão de ser quando encarado como consequência derradeira do homem, fora disso, se descaracteriza. Destarte, esse humanismo, segundo Nietzsche, joga o homem no centro da verdade e no núcleo das coisas, deixando para todo o resto o status de aparência e jogo ilusório. Tem-se então o afirmar da paidéia e os reflexos da mesma na conformação de um homem universal, senão em sua emancipação cognoscente; eis quando temos a convergência entre Nietzsche e paidéia trágica.

Trazendo à tona Anaximandro e os pré-socráticos, Nietzsche pretende apresentar toda a grandeza da existência, a qual, a paidéia se dispõe a eternizar. Glosando por este caminho, caracteriza a moral como fenômeno que não se legitima, todavia se penitencia de forma imorredoura, isto é, dentro da universalidade humanística, perseguida pela paidéia, a moral é, também, elemento de importância ímpar. Neste momento Nietzsche apresenta um caráter vivo e dialético ao ideal emancipacionista do homem; eis o vir-a-ser da razão profunda.

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