segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Viagem ao Fundo da Alma...


Tarso
Parte I


"Vivo em um corpo emprestado, talvez eu seja um dublê de retrato... o não pertencimento se parece muito com esse sentimento. Será isso um estado de espírito? Não sei! Mas também, pouco importa... preciso retomar minha atividade... é a responsabilidade e o trabalho que me possibilitam a liberdade."

O campo é vasto, repleto de boas-novas e de ervas daninhas, todavia sua persistência é infinita, as vezes ultrapassa o ciclo dos homens.

Apesar de ter assumido responsabilidades muito cedo, Tarso entende que tal situação é necessária, sobretudo quando estas responsabilidades lhe possibilitam a liberdade. Ele sabe que sua vida sem a liberdade não tem o menor valor. Assim foi a vida de seu pai, assim será a sua...

Sério seguidor das tradições, somente dentro delas se sente livre. Este homem de bem, valoroso, sempre disposto ao trabalho e às responsabilidades, filho exemplar... o que mais uma mãe poderia querer? Nem mesmo a labuta tira a seriedade de homem tão probo... é cedo que se aprende a trabalhar dignamente. Tens o trabalho como uma religião, sua natureza sagrada é a alavanca de uma vida honesta e ordeira. Nada melhor que viver em harmonia com as pessoas e em consonância com os bons costumes. Ética e moral são os dois pilares de uma vida feliz e regrada.

Necessariamente, estes são os valores que Tarso optou por seguir e, como tal, sua vida é extremamente sistemática e correta. Até os detalhes podem marcar a integridade de um homem... apesar de suja, pelo trabalho na terra, tens a camisa sempre impecável... caráter, eis a palavra certa.

Ele sabe que o modo como nosso corpo elabora a vida escapa-nos por completo. Dessa forma, só uma vida minimamente organizada e excepcionalmente controlada pode livrar o corpo dos males da vida mundana. Uma vez que não se pode exercer controle sobre o mesmo, resta-nos apenas seguir a estrada com presteza, evitando os atalhos e o caminho tortuoso.

A vida humana carece de ordenação, logo, segue Tarso sua vida. A regularidade é seu norte condutor. Porém, em alguns momentos de insanidade acorre-lhe pensamentos sombrios. É neste momento que procura a luz do dia e sua labuta diária, é preciso esquecer... ao fazer isso, seus pensamentos ruins se dissipam.

Como dito acima, dentro da tradição, alguns detalhes podem afirmar a probidade dos homens. O olvido é um deles, sempre que possível é necessário se esquecer das desventuras do passado. Uma vida íntegra deve manter certa regularidade, sua pureza deve advir desde o nascimento. Caso surja pelo caminho uma situação atípica, não prescrita, o bom homem deve se lembrar da Santa Providência, afinal de contas, nossa vida provêm e é provida por ela.

O essencial para olvidar tais desventuras é a luz do dia seguinte, com sua lida regular. Ao transpirar, o homem amadurece sua obra, e esta obra, ao amadurecer, dará frutos belos e límpidos. Porém, esta façanha só é possível após uma vida de suores, o lazer nada mais é que o trepidar do arado e, logo em seguida, o roçar da enxada; isto sim é diversão. Tendo no trabalho o norte da vida, tem-se a dignidade de seguir altaneiro e sóbrio.

Estas lições de vida Tarso traz de seu pai, homem, também, probo e íntegro... jamais deixou a família passar qualquer tipo de necessidade, apesar das desventuras de um dia macabro e chuvoso... Desde tenra idade, assim como seu pai, soube valorizar o trabalho, desprezando a vida mundana... esta última, vale de lágrimas e desesperos.

Aprendendo que o homem só adquire sua liberdade após muito labor, aprendeu também a valorizá-la, dia-a-dia, como uma ode aquilatada pela ventura e apresentada pela sensatez.

Ao pensar no vazio, estará traindo a si mesmo, porque uma vida vazia pode comprometer nosso estado de consciência. Mente ociosa, além de ser perigoso, faz as pessoas pensarem em coisas erradas. Ao pensar no vazio estaríamos nos esvaziando também, por isso a necessidade de pensar nobremente. Os que ficam a divagar sobre substâncias fúteis não produzem. Somente com bastante produção atingimos a liberdade... liberdade é poder usufruir das coisas. É a produção o caminho para a utilidade, caso a vida perca sua utilidade, ela se nulifica. Eis o motivo de Tarso valorizar tanto seu trabalho, exemplo que deve ser seguido por todos, sem restrições.

Pobre do ocioso, este sim perde sua liberdade em detrimento da futilidade do mundo. O viver deve vir atrelado ao labor e à ordem. Uma vez que liberdade é labor (e ainda, a vida nos cobra este labor, alijando-nos da nulificação), ser livre é trabalhar em prol da família.

2002


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