segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Notas Sobre o Passado

Um adendo a "Sobre História... e Otras Cositas Más"

Quando evocamos o ditado "Tudo vai passar" (a la Tchecov), a primeira afirmação que nos acomete é a de que o passado sempre aí esteve. E de uma forma ou de outra - mesmo que não queiramos -, assim voltará. Talvez diferente, talvez o mesmo. Sempre haverá lembranças que nos evoquem o que somos, e como a isso não conseguimos fugir. Daí, são essas lembranças que manterão vivas nosso passado... e o que dizer, então, do esquecimento, quando o passado que temos não é o que fizemos?

Quando traçamos, ademais, uma linha que nos vincule à modernidade que este passado forjou, resta a garantia, ao menos para a modernidade, de que a História não será diferente. Mas, queremos realmente a diferença? Ou será que o passado (e nossas lembranças por ele desencadeadas) não estaria sempre assumindo um limite para o que deveríamos lembrar?

A partir disso, um outro assombro: a modernidade quer nos mostrar o caminho. Mas pensando que este caminho viera pelo passado, o que, então, mostrar a nós? Diz-se, ainda baseado na modernidade, que a tendência é fazer com que, nela - a modernidade -, os indivíduos poderiam definir suas potencialidades.

Que potencialidade é essa que nos faz, ao invés de escolher, sermos escolhidos por nossas lembranças?

E nossas lembranças, por que ainda continuam a partir de nossos subterrâneos? Como fazer, para dessas lembranças, bem ou mal, trazer as vivências que mais nos formaram e nos transformaram? E que formações gostaríamos que fossem nossas?

Está aí um imbroglio difícil de ser solucionado. Às vezes por faltar-nos controles de nossas lembranças, outras vezes por nos trazer lembranças subterrâneas, há muito recônditas.

Nesse momento entra em cena um outro elemento: o quê fazer da tradição, advinda do passado - e de nossas lembranças -, e formadora do que viria a ser a modernidade? Essa que, segundo consta, tenta desenvolver as potencialidades do indivíduo?

Contardo Calligaris, no ensaio 'O Passado', da Folha de 01/11, assim dirá: Mas se o legado da tradição se torna menos relevante, é justamente porque o que me constitui é minha história - não apenas a intensidade do momento e a audácia de meus planos, mas o conjunto das experiências que vivi. Bem, e daí?, as experiências que vivi, conforme as lembranças que omiti, teriam tanta coesão psicológica - e até histórico-filosófica, visto que somos o montante, e a consequência, dos erros vários de nossas gerações precedentes - para determinar o que eu poderia ser a partir do presente tênue que me re-faz constantemente, e a cada instante?

As revoluções são sintomáticas para melhor entendermos isso. Elas surgem, quando despontam do fogo, com a intenção de botar tudo abaixo (vide o exemplo da Francesa, que pensou, inclusive, em mudar o tempo, aliás, a contagem do tempo - seria o tempo tão vigoroso assim, como imaginamos?) e, das cinzas, sem usá-las, é claro, construir algo novo.

No entanto, quando surgem vigorosos debates acerca de como fazer isso, alguns vestígios acabam sendo poupados, inventando com isso os museus públicos, e as lembranças deles advindas... poucas décadas depois da Revolução Francesa nascem os conceitos de patrimônio histórico e de preservação de monumentos, surgindo, com isso, grande interesse pela narração e compreensão da História...

Como conquistar o novo sem se desvincular do antigo, do velho e do passado... e ainda, até de nossas lembranças?

Reminiscências de outrora...

Um comentário:

Walmir disse...

Será que esta idéia de novo é relevante, caro professor? Se como diz o velho Ago0stinho, somos o presente do passado, o novo também o será. Como desvincular isso? Seria uma lobotomia.
O mistério do tempo é algo que sempre me intrigou, pois sabemos bem o que é cronologia, mas o cronos mesmo não sabemos.
Uns xamãs mexicanos pensam que o tempo é uma ilusão, que tudo que chamamos de passado, de presente e de futuro é algo estático. E nós, como seres percebedores, vamos nos deslocando desta para aquela percepção, e é a isto que chamamos tempo. O restó, para eles, é apenas o incogniscível.
O espaço sabemos bem o que é, podemos medi-lo, é palpável, mesmo que curvo como afirma a ciência desde Einsteim. Mas o tempo é impalpável, uma abstração relatada em cronologia registrada pelo movimento dos astros, dos corpos. Medimos coisa que não sabemos o9 que é. Não é uma loucura? Não é o incogniscível dos xamãs?
Dentro desse mistério o que é modernidade, pós-modernidade, neo-barroco?
São resquícios de ações que a história atribui valores?
Estou muito para mistérios, hoje, meu amigo.
paz e bom humor