segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ondas de Heráclito!


Para se conhecer o mundo e nos conhecer, mais que uma observação imediata do que está sob nossos sentidos, precisamos também de história viva, pois sempre foi ela que fundamentou estes sentidos de agora. Assim, precisamos do passado, nem que este precisar seja para não repetir seus erros, revendo os fatos de outrora e repensando as atitudes de agora. Mas, mais do que isso, toda a construção psicológica, moral e política que nos antecede, já nos chega com uma outra história ainda mais antiga. Este é o ponto..., esta história mais antiga é o verdadeiro local a ser desvendado.

A observação imediata de si está longe de ser suficiente para aprender a se conhecer: precisamos de história, pois o passado continua a correr em nós em cem ondas; nós próprios nada somos senão aquilo que sentimos dessa correnteza a cada instante. (Humano, Demasiado Humano, II, § 223) A transformação que advém desse processo de construções imediatas de auto-conhecimento é sempre criar-se do antigo e intercedê-lo junto ao novo, são ondas que percorrem não somente o corpo, mas todos os sentidos ambivalentes que o corpo sente, estando no mundo. A felicidade por albergarmos algo novo neste universo antigo está em saber compreender onde está o problema e qual a possibilidade de se ter chegado a este problema, e ainda, saber reconhecer que o outro pode não estar tentando se construir tal como nós.

Mais que um problema, procurar uma solução e sentir em todo nosso ser o lambido destas ondas; ondas que a cada instante nos traz informações ainda mais distintas, em situações as mais variadas. Os resíduos vivos que estas ondas trazem ao nosso corpo e lambem nossa mente, podem ser uma proposição sempre nova àquilo sempre existente, ou àquilo ainda não-pensado, logo, simbolicamente não-existente.

Essa é a sabedoria que pouco a pouco se tornou amanhecida, mas apesar disso permanece tão forte e substanciosa quanto era outrora: assim como aquela, segundo a qual, para entender história, é preciso ir à procura dos resíduos vivos de épocas históricas (...), (§ 223) e o viajar, tal como Heródoto nos tempos antigos, é procurar por alguma coisa a mais que pó e mágoa; é procurar em cada cultura o que ela tem de mais vivo, vibrante e exótico. A procura destes resíduos vivos pode ser feita também nos hábitos deste nosso tempo presente. Pode ser vista na face de cada pessoa, em seus valores e, sobretudo, em seus preconceitos. Esta é a parte viva do tempo, a mesma que constrói história para além do passado.

Construindo-a sempre disposto a recomeçar, sempre disposto a destruir, para novamente levantar suas peças. A história deveria se vestir, sempre de novo, porém sem jamais se esquecer de olhar para trás, pois a indumentária do tempo é nova e viva, é velha e morta. Esta ambivalência e sua ambiguidade é a parte viva que nos falta neste eterno construir.

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