terça-feira, 2 de novembro de 2010

Argonautas do Futuro!


Da mesma forma que nossa lealdade às nossas convicções pode ser ledo engano de valorações remanescentes e cheias de recalque, pode também significar que o universo inteiro conspira para que nosso espírito e nossa vontade de verdade continuem encobertos; por outro lado, pode significar que estejamos almejando algo mais, algo que se encontra acima do já posto, algo que se encontra além do já existente.

Em certa passagem de sua obra, Nietzsche se refere aos argonautas do futuro, seres nobres e imaginários que se encontram além da linha geográfica que separa o ser humano medíocre do semi-deus, pode-se dizer que é justamente esta espécie que joga por terra a lealdade de suas convicções humanas e busca, para sair do semi, tornar-se um deus de fato, sem recalques nem convicções enganosas..., ele precisa de convicções incômodas e desapegadas. Ele precisa desagradar o mundo.

Buscam o antagonismo natural que perpassa toda a humanidade, encontrando com isso elementos de mudança e evolução, jamais subterfúgios e fugas. Busca caminhos que margeiam a existência humana, trazendo para o centro de sua própria existência algo novo e diferenciado. Caminhos tortuosos que não o levem a novos mares, mas ao mesmo mar de sempre.

A adversidade natural de sua existência daria cor, ditaria ritmos e concluiria uma caminhada que não cessa, mas que constantemente se renova e se refaz. Se constrói e se destrói... se alimenta de restos e cria sua própria comida. Traz néctar de deuses em copos americanos, quebra taças reais e as esmaga.

O ideal de valor a que se busca, deve estar fora das margens argonáuticas, além de não ser o ideal de deuses, seria, isso sim, o ideal de vermes energúmenos que se consideram... que pensam que são algo inexistente. É o ideal que acreditam permear sua vida, mas que apenas os escravizam, os destroem... sem construí-los.

Para confirmar esta enganação a ciência está longe de repousar o bastante sobre si mesma, precisa antes, sob todos os aspectos, de um ideal de valor, de uma potência criadora de valores, a serviço da qual ela pode acreditar em si própria – ela mesma nunca é criadora de valores. (Para a Genealogia da Moral, III: § 25), visto que, sua aceitação não se encontra nela mesma, mas na forma como o mundo a enxerga. Está na forma como seu foco se volta a algo enganoso e engenhoso, algo que ela tentar fazer acontecer. E isso nos lembra o ser humano, pois tenta se afirmar, negando algo que lhe é natural e próprio.

Entrementes, acreditar em si mesmo pode ser o primeiro passo para a escravidão, principalmente quando este acreditar está a buscar aceitação em quem nos vê. É como se estivéssemos querendo agradar alguém para agradar a nós mesmos, fugindo daquilo que desagrada o outro e que se torna, ao mesmo tempo, um estorvo para a sociedade. Tornamo-nos, deste jeito, escravos de valores de outrora; escravos de uma obsessão compulsiva de auto-afirmação, aliás, de auto-afirmação enganosa.

Não queremos ser nós mesmos, é como se quiséssemos ser alguém que pode olhar para o outro e justificá-lo. Se a justificativa é nossa própria existência, esta última passa a ser o engano e a negação. Ao afirmar o outro, achando que afirmamos a nós mesmos, desagradamos àquilo que temos de mais nobre e argonáutico, nos negando esta nobre situação: desagradamos à nossa vontade de potência, à nossa vontade de superação do ser medíocre que sempre fomos.

Nenhum comentário: