domingo, 30 de outubro de 2011

Sobre a Escola da Ponte



O modelo de monodocência, onde o professor determina o que é melhor para o aluno, isto é, o que ele deveria aprender, de um ponto de vista macro, pensado como uma lógica burocrática e corporativa de mera adição (em que o aluno apenas recebe “líquido” e o professor apenas deposita), confrontação ou justaposição de papéis educacionais (ALVES, 2004: p. 115) é o ponto de crítica para o programa da Escola da Ponte, modelo educacional existente há alguns anos em Portugal – Escola da Ponte nº 1, situada em Vila das Aves, na Vila Nova de Famalicão, terra do escritor Camilo Castelo Branco –, e este foi o exemplo utilizado por Rubem Alves para tentar justificar o título de seu livro e um novo modelo educacional.

Ao desejar uma escola que fuja dos padrões da escola tradicional, Rubem Alves se inspira no modelo adotado nesta localidade de Portugal – Vila Nova de Famalicão –, ponto de referência para o título de seu livro de crônicas: A Escola Com Que Sempre Sonhei Sem Imaginar Que Pudesse Existir, (2004).

Modelo que se baseia no pensar a educação como uma aventura coletiva de partilha em que saberes, expectativas e experiências dão valor e sentido à vida.

Local em que a criança, com o bailar de seu corpo, define o que quer aprender. Um aprender que estaria intimamente ligado à vida. Um espaço em que se vive o que se aprende e se aprende o que se vive.

Na escola tradicional o docente é pensado como uma ilha autônoma dentro de um arquipélago, onde cada um tenta construir sua própria identidade (quando se consegue tal feito), ou mesmo a identidade do que ele concebe como sendo o correto da educação. Assim, definir monodocência é como tentar encontrar, numa ilha, um coletivo de papel.

A Escola da Ponte, por outro lado, é uma escola que se referenda nos seguintes valores: Uma equipa coesa e solidária e uma intencionalidade educativa claramente reconhecida e assumida por todos (alunos, pais, profissionais de educação e demais agentes educativos) são os principais ingredientes de um projecto capaz de sustentar uma acção educativa coerente e eficaz [sic], informações que fazem parte dos princípios fundadores da Instituição. A Escola da Ponte pode ser vista como uma escola em que a hierarquia não se apresenta de uma forma direta, um local onde o projeto pedagógico do professor não é só dele, mas um constructo coletivo.

Talvez essa hierarquia se mostre apenas em lastros educativos, local em que as crianças mais velhas ensinam as mais novas (os miúdos). Jamais em lastros organizativos, visto que a educação, quando coletiva, traz para mais perto das pessoas sua real importância, por isso, essa hierarquia organiza, não comanda e nem impõe.

Uma escola que tem como intencionalidade educativa a formação de pessoas e cidadãos cada vez mais cultos, autónomos, responsáveis e solidários [sic], em que a construção do conhecimento acontece de forma coletiva, com a ajuda de todos aqueles que se interessem pelo projeto.

A escola que Rubem Alves almeja deve ser uma escola que não se traduza em algo mecânico e compartimentado ou em disciplinas curriculares inarticuladas de conteúdos ou objetivos avulsos. Quer-se com isso dar autonomia ao aluno, para que ele comece a escrever a própria vida, visto que ela é única e irrepetível.

Daí a importância em repensar a escola que, para Alves, deveria ser como a da Ponte: uma práxis de educação na cidadania, pois, é da prática do civismo que resultaria a aprendizagem na consciência da cidadania.

Em se pensar que nossas escolas não conseguem mais colocar consciência nas crianças, e estão longes de, junto a isso, imprimir-lhes cidadania, é um projeto muito interessante, e como consta no livro, com alguns relatos de educadores e pais, é um método que realmente funciona. Educar na cidadania não é o mesmo que educar para a cidadania; ao menos não nos moldes das escolas brasileiras.

Hoje a escola parece muito mais um depósito de criança, em que o que vale não é mais o saber em si, mas manter as crianças ocupadas por um tempo, para que os pais possam ficar livres delas e, ao mesmo tempo, garantir alguns trocados no final do mês. Quer-se crer, infelizmente isso faz parte do ponto de vista de uma grande quantidade de pais, que a escola serve tão-somente para dar Bolsa Família, não mais para educar na cidadania.

Educadores como Rubem Alves acreditam que a aprendizagem e o ensino sejam um empreendimento comunitário, uma expressão de solidariedade das pessoas para com o mundo. E mais que aprender saberes, as crianças deveriam aprender valores – como nos faz acreditar que isso acontece em Vila Nova de Famalicão –, se não por completo, ao menos em grande parte de sua vida estudantil; em sua vida de aprendente. Na Escola da Ponte a ética perpassa silenciosamente, sem explicações, o quotidiano das crianças e suas relações naquelas salas imensas.

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