segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Filosofias da História e Temporalidades


A história realmente existe, é real, mas a interpretação que fazemos da história é, por vezes, uma invenção. William Burroughs um dia disse: “Não nos damos conta de até que ponto a história é ficção. O passado em grande parte é uma invenção dos vivos. E a história é um montão de coisas fabricadas. Não há fatos de verdade.” Os fatos só existem para nós, não existem em si mesmos. Lembro-me de uma indagação de Kant: uma árvore na floresta que nunca foi vista por nenhum ser humano, ela existe? A história é uma ciência que estuda os mortos, assim os vivos fazem o que quer dela e os mortos nada podem fazer do que dizem deles. Mas, então qual a importância da história em nossas vidas? George Orwell já dizia em 1948: “Aquele que tem o controle do passado tem o controle do futuro”. Em outras palavras: aquele(s) que escreve(m) a história faz(em) da forma que melhor lhe(s) convém. O que lhes for ruim apaga-se com a borracha da ideologia dominante. A ideologia dominante escreve a história dos vencedores e já impõe a vitória antes mesmo do fim da guerra, isto é, decreta o vencedor nas páginas da história, mas a história não acabou e ainda está acontecendo, o que fazemos agora pode mudar o que foi feito, mas os ditos vencedores que controlam a história não querem que pensemos dessa forma, assim separa-se a história em passado que não se muda, onde se elege o vencedor, em presente que é decorrente desse passado e, portanto, também não se muda e em futuro que é continuação do presente e, assim se mantém a dominação. A ideologia dominante é fundamental para justificar essa sociedade injusta, assim a história é o instrumento que a ideologia utiliza para a continuidade das injustiças sociais que se estabelecem no domínio de uma minoria sobre a maioria da população mundial. O bem estar é confundido com o que temos, com o que conseguimos ter e não com o que somos ou o que conseguimos ser. O dinheiro toma o lugar do homem/mulher: não é o que você é, é o que você tem. O dinheiro fez dos homens mercadorias e a todo o momento estamos à venda e estamos à compra, sem se dar conta disso. Nesse sentido, a própria forma de interpretarmos o tempo já nos impõem um controle social sem que o percebemos. Como? Ora, o nosso tempo é linear (passado, presente e futuro) essa organização temporal já nos força a acreditar que temos sempre que melhorar, que progredir, assim, somos super responsabilizados no nosso dia-a-dia e, como na maioria das vezes, não há mais espaço para o “sucesso” nessa sociedade, que é injusta e desigual, passamos a vida toda frustrados, vencidos e derrotados por que não conseguimos progredir através dos anos. Percebem? A própria forma de contar o tempo já nos impõe a ideologia dominante. Esse tempo progressivo (do menor para o maior) é realmente necessário? Não! Vamos conhecer agora novas formas de concebermos o nosso próprio tempo e veremos que há várias outras possibilidades que não são interessantes para a ideologia dominante, isto é, para quem está no poder.




A noção de eterno retorno de Nietzsche: O que aconteceria se, num dia um demônio te dissesse: Esta vida, tal como agora a vive e a viveu, deverás vivê-la ainda outra vez, e outras vezes inumeráveis... A eterna ampulheta do tempo será eternamente virada ao contrário e você com ela, ínfimo grão de poeira – voltará ao começo como num eterno retorno. Você, certamente, amaldiçoaria o demônio que assim o falou. A não ser que tenha vivido uma vez um instante fabuloso, e assim teria respondido: Você é um deus e nunca ouvi coisa mais divina. A idéia pensa sobre a possibilidade de cada momento da nossa vida se tornar eterno e se repetir ao infinito, ter-se-ia assim, um rigoroso critério de avaliação: só um ser perfeitamente feliz poderia querer uma tal repetição eterna. Inversamente, porém, apenas num mundo que deixasse de ser pensado no quadro de uma temporalidade linear seria possível tal felicidade plena. O nosso tempo linear se articula em presente, passado e futuro, implica assim, que cada momento só tem sentido em função dos outros numa linha do tempo, assim cada instante é um filho que devora o pai que, por sua vez, será devorado pelo seu filho, assim sucessivamente. Dessa forma, não conseguimos ser felizes, pois a felicidade de hoje implica numa felicidade de ontem que já não existe mais.











A noção de processo histórico de Marx: Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxilio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestados os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar-se nessa linguagem emprestada. Assim, Lutero adotou a máscara do apóstolo Paulo, a Revolução de 1789-1814 vestiu-se alternadamente como a república romana e como o império romano, e a Revolução de 1848 não soube fazer nada melhor do que parodiar ora 1789, ora a tradição revolucionária de 1793-1795. De maneira idêntica, o principiante que aprende um novo idioma, traduz sempre as palavras deste idioma para sua língua natal; mas só quando puder manejá-lo sem apelar para o passado e esquecer sua própria língua no emprego da nova, terá assimilado o espírito desta última e poderá produzir livremente nela. Esta idéia de Marx demonstra como o passado é manipulado no jogo político do presente. Como os lados que estão em combate no presente se utilizam de personagens históricos para justificar suas posições políticas e legitimar os seus governos.












A noção de projeto de Sartre:
Segundo a metáfora já antiga, o tempo flui como um rio que passa. As águas correm de modo contínuo, vindo da fonte em direção ao mar, como o tempo que também escoa de modo contínuo. Se essa imagem for tomada a sério, o presente aparece como conseqüência do passado e o futuro como conseqüência do presente, tal como as águas, que vêm lá de trás e vão sempre para adiante. Pode-se representar esse mesmo modelo traçando uma linha reta, da esquerda para a direita: o passado atrás, o futuro à frente. Sentado à beira do rio, a água que agora passa diante de mim foi produzida há alguns dias atrás, nas montanhas, e vai em direção ao mar. Entretanto lembra Merleau-Ponty, as massas de águas que passam agora diante de mim e vão para o mar não vão em direção ao futuro, como ingenuamente supõe a metáfora; ao contrário, elas desaparecem no passado (que já passou por mim). Mas não se trata apenas disso. Se me afasto da beira do rio, considerando-o em si mesmo, verifico que a água que passará amanha naquele ponto em que não estou mais, está nesse momento na sua fonte. Do mesmo modo, a água que acaba de passar está agora um pouco mais abaixo. A água que vem lá da fonte será futuro para mim se eu estiver à margem do rio; a água que acaba de passar será passado para mim se eu estiver à margem do rio. Se eu não estou, se o mundo é tomado em si mesmo, verifico que esse futuro e passado são presentes no mundo, não existem como futuro e passado: eles não se sucedem. Percebo que é presente eterno, o mundo não é temporal. Sartre observa que as coisas, nelas mesmas, não são temporais, e que apenas para nós há passagem do tempo, não há temporalidade em si mesma.

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