terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Devaneios Orgásmicos


"Tem merda na calçada, toda a rua está tomada de água, o barco que passava por ali afundou na esquina de baixo. Mas, no entanto, a merda continua sobre a calçada, usurpando a liberdade dos pés das pessoas.


 

"Não imagina o quanto isso é sujo... o homem é sujo, todavia pisa na merda. Seu pé se rebela, os cus se embriagam de prazer... felicidade pros cus, tristeza pros pés. Até mesmo os flatos de Rubem Fonseca se atiram a esse desatino desordenado de excrementos. Sua copromancia não pode prever o prazer dos homens, o desafogo dos cachorros... mas a rua continua alagada.


 

"Cheio de excremento o homem segue sua rotina, apenas seu olfato aprova seu cu. Dentro do banheiro, admirando a merda boiando no vaso e seu cheiro penetrando no ambiente, embriagando o homem, buscamos nossas origens, profetizamos nosso futuro... espere aí, ele está nu sobre a latrina. Sua privada, testemunha ocular de seu futuro, réu confesso de seus excrementos... mas o odor já chegou na sala de estar, e enquanto isso, ninguém ainda limpou a calçada. Confesso que prefiro a bosta da calçada que o lixo molhado das ruas, após a chuva.


 

"O que acontecerá com o barco, e o banheiro do homem nu, até quando vai esconder seu futuro? Pode parecer absurdo, porém, a copromancia ainda tem muito a nos dizer, nem mesmo eu a conheço direito, contudo, sei o quanto eres útil... pelo menos a calçada permaneceria mais limpa, longe dos olhos molhados dos cachorros, com seus focinhos úmidos e frios, depois da chuva. Não sei, mas acho que cagar é a experiência máxima da liberdade humana.


 

"Somente nossa privada sabe o quanto é bom estar sozinho conosco... um bom livro, o jornal diário: acho que vou pra coluna de política... No Congresso Nacional... O alívio de um intestino bem resolvido... só ele é capaz (junto com a privada, é claro) de expressar os limites de nossa liberdade, mas cadê o papel?"


 

Somente aí Albertina se lembrou do que estava fazendo no banheiro após uma refeição mal resolvida. Seus devaneios ultrapassaram a noção da normalidade. Sua vida em absurdo não consegue se conter, mas a mente processa vinte e quatro horas seus delírios.


 

Todavia, não foi só aquela refeição à beira da praia, foi também aquele chá de cedo.


 

O tempo, lá fora, pode passar, mas Tina continua dentro do banheiro, sobre a privada. Nestes momentos nada interrompe seus desatinos... nem mesmo a merda da calçada.


 

"Precisamos fazer alguma coisa, se esta situação continuar perderemos o barco da calçada... apesar do que, ele já afundou mesmo.


 

"Até nas vidas, melhor preparadas, chega um momento em que o homem desmorona. Seus atos se constróem como um monólogo... o eu e o eu sozinho. Dessa construção o homem tenta atingir o ápice de sua subjetividade... é neste momento que o cu entra em cena, uma força sobre-humana se encarrega de depositar excrementos pelas passarelas do inconsciente.


 

"Sua vida começa a boiar dentro do vaso sanitário do cognoscente... o monólogo se apresenta como reflexo de uma força peristáltica no baixo ventre. Sua explosão sai como um peido... cheira mal mas alivia o intestino. É neste momento que a cena atinge seu momento mais ambíguo, a platéia vaia ao mesmo tempo em que o intestino ovaciona; do lado inverso, a bexiga borrifa um jato quente sobre a água... o mijo se apresenta em cena, acontece o clímax!


 

"O inconsciente subjetivo se apresentou de duas formas concisas e salutares... do monólogo surge o absurdo e da cena o imprevisto... o palco cai e o narrador vai ao chão... Qual futuro, se as pernas vão apodrecer e nos enterrar? Surge a náusea, vem o vômito, e novamente o alívio... apesar das vaias o sorriso vem ao nosso rosto, pegamos o banquinho, subimos de novo no palco e agradecemos a multidão... acho que vou vomitar..."


 

Uma pausa, um borrifo... Tina vomita em todo o azulejo do banheiro, suas vistas se escurecem e por segundos a cortina se descerra. Alguém bate lá fora... um grande silêncio..., ninguém responde e a porta é arrombada... a cena dá nojo, todavia, no fundo, o vômito foi mesmo a melhor coisa a se fazer. O intestino e o estômago estão limpos novamente. Seu corpo é suspenso, suas vestes arrancadas, o sexo exposto... parece úmido e excitado... (in)felizmente, não deu para controlar...


 

Após um banho frio Tina se vê, outra vez, sobre a cama... tudo parece como dantes, a vida volta ao normal; mas a sensação de prazer e devaneios idos (apesar de terem sido inconscientes) ainda está em sua memória... o orgasmo!

Um comentário:

Clio & Dionísio disse...

Cara, fiquei com estômago embrulhado, mas como tem uma picanha assada me esperando não posso decepcionar, hehehehe!