terça-feira, 21 de abril de 2009

Seção D'Outro


O Declínio de Nós Mesmos
Maurício Bozatski - amigo blogueiro e mestreiro


Certa vez eu li o livro O Declínio do Ocidente de Oswald Spengler, no qual, em suma, o autor reconhece a ascendência morfológica da vida sobre a razão e do dinheiro e da máquina sobre a cultura e o indivíduo. Este livro atraiu intelectuais revoltados com os Estados Unidos por ser uma ‘civilização comercial’ puritana. Nos anos trinta do século XX, o texto de Spengler foi escolhido como um dos dez ‘livros que mudaram nossa mente’.

Segundo o declínio do Ocidente a cultura é cíclica e é possível basear-se no declínio de outras civilizações que outrora já foram grandes modelos hegemônicos da cultura e da economia para prever o futuro da nossa. Pensemos no Antigo Egito e nos seus faraós e deuses cujas reminiscências arqueológicas figuram hoje apenas como atração turística e intelectual para arqueólogos e historiadores. Lembremos da Grécia Antiga e seu legado que malmente compreendemos, pois a ideia de uma democracia numa cidade sustentada por escravos é estranha até mesmo para o mais dogmático dentre nós que acredita viver em uma democracia. Voltemos o olhar para o Império Romano e veremos um Direito estruturado sobre doze tábuas apoiadas muito mais nos bacanais e nas areias ensangüentadas das arenas de gladiatura do que no mármore do senado republicano. Enfim, não há modelo cultural ou progresso civilizatório que dure para sempre, contudo, os vícios parecem se repetir indefinidamente.

O fato de eu ter completado vinte e nove de existência na semana passada me fez pensar que em meio aos apertos de mãos e abraços de congratulações eu estava de fato dando mais um passo em direção ao meu declínio pessoal, e então me pus a relembrar onde eu estava aos dezenove e aos nove anos de idade. Minha memória sempre respondeu aos meus chamados insólitos, contudo, desta vez, eu apenas recordei onde estava no meu aniversário de dezenove anos. Lembrei que estava pescando e tomei uma grande chuva que me fez sair às pressas de um pesqueiro no Rio São João. A chuva também me fez contrair um parasita que deve ter descido em forma de ovo que algum mosquito havia depositado na copa de alguma árvore e que se alojou em meu couro cabeludo. Sobre o aniversário de nove anos eu não me lembro de nada. Foi então que fui pesquisar o que acontecia no Brasil e no mundo em 1989, e foi esta pesquisa que me fez recordar de Spengler.

Dentre os fatos mais notáveis de 1989, cabe destacar a criação da World Wide Web pelo físico inglês Tim Berners-Lee; Um avião da Varig cai na Amazônia; São Francisco é atingida por um grande terremoto; A extinta União Soviética deixa o Afeganistão depois de nove anos de ocupação; A rede de televisão Fox estréia a primeira temporada dos Simpsons; O presidente George W. S. Bush se encontra com o presidente Gorbatchov da União Soviética na costa de Malta, no que seria o prenúncio do final da Guerra Fria; A sonda Voyager 2 chega a Netuno; Israelenses e muçulmanos trocam hostilidades; Na China, estudantes protestavam contra o regime socialista. O Brasil passava por sua primeira eleição presidencial democrática depois da ditadura militar; José Sarney era o presidente do Brasil; Fernando Collor seria eleito presidente vencendo Lula no segundo turno.

Já em 2009, não é preciso fazer uma pesquisa, mas apenas lembrar-se de alguns fatos. Um terremoto atingiu a Itália; Há tropas americanas ocupando o Afeganistão; A China continua socialista, mas os estudantes já não protestam, apenas os monges tibetanos fazem isso agora; A rede de televisão Fox estréia a vigésima temporada dos Simpsons; O presidente norte-americano Obama se encontra com o líder venezuelano Hugo Chavés, ganha um livro do Eduardo Galeano deste, no que pode ser o prenúncio do final da hostilidade entre os dois países; Israelenses e muçulmanos trocam hostilidades, cercos, tiros e embargos; NASA lança a sonda Kepler no intuito de encontrar exoplanetas; A Google lança sua plataforma Street View para cidades brasileiras e portuguesas; A Cúpula das Américas termina com apenas uma assinatura no documento final; No Brasil, Lula é o presidente da República; José Sarney é o presidente do Senado e Fernando Collor é o presidente da Comissão de Infraestrutura.


Parece que nestes vinte anos as coisas tem se repetido ciclicamente e com exceção de alguns nomes, datas, lugares e cargos, tudo permanece o mesmo. Os mesmos poderes, os mesmos interesses, a mesma falsidade, as mesmas catástrofes, os mesmos anseios. Enfim, parece que Spengler estava certo, e de fato a vida excede a inteligência. Então nos próximos vinte anos vou me preocupar menos em entender o mundo e mais em vivê-lo. Pois, independentemente de minha vontade o mundo ocorre, as coisas se repetem e esta civilização e eu caminhamos rumo ao nosso declínio, apenas espero que o meu seja mais demorado que o dela.


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