domingo, 31 de outubro de 2010

Preconceito...

O maior preconceito que podemos ter de qualquer coisa é não reconhecer que o diferente pode ser muito mais próximo da gente que imaginamos, ou que algum dia imaginaríamos existir. Este diferente, no fundo, é exatamente o que gostaríamos de ser e que não temos competência e sabedoria o suficiente para disso nos utilizarmos, ao contrário, quando agimos de forma preconceituosa estamos nos privando do que o mundo, de forma distinta, tem de bom a nos mostrar.

Enganar-se, nesse sentido, nada mais é que reconhecer que estamos errados quando tentamos negar a diferença que o mundo nos oferece, afirmando a verdade que o mundo apresenta, e sua semelhança rastaquera e lugar-comum. Seria, pois, uma consumação de que o conhecimento se nos apresenta sempre de forma inesperada e, acima de tudo, nova e vibrante. Apesar dos recalques que perseguem nossa vontade de existir.

Como diria Nietzsche em Para Além de Bem e Mal: as coisas de supremo valor têm de ter uma outra origem que aquela que fingimos não buscar, pois, ao buscarmos o outro, criamos uma suspeita ao mundo, oferecendo algo que, por um motivo ou outro, fingimos negar. E a suspeita é o primeiro sintoma de que o preconceito está a fugir de nossas plagas.

Este mundo sempre se mostrou como um emaranhado de ilusões, resta fazer destas ilusões uma criação exagerada do que poderíamos ser, uma vez que apenas no exagero conseguimos expressar qual o real significado de nossa existência. Existência essa pensada como um Deus desconhecido, averso a sua real necessidade. Este mesmo Deus escondido, entranhado em nossas vísceras, grita por ser descoberto. Grita por fazer existir, dando-nos uma existência tal como deveria ser a nossa...

Por isso, nossos maiores preconceitos podem estar escondendo de nós nossa real existência, exatamente esta que necessitaríamos fazer vir à tona. Se eu existo, de forma sintomática, insisto em querer fazer desta existência algo que se encontra acima de nossa (e minha) medíocre meia-vida, aliás, de nossa (minha) não-vida.

O mundo sempre foi criado por pessoas que, em momento algum, nos mostrou a realidade da vida em abundância: Esse modo de julgar constitui o típico preconceito pelo qual se reconhecem os metafísicos de todos os tempos; esse modo de estimativas de valor está por trás de todas as suas proceduras lógicas; a partir dessa sua “crença”, eles se atarefam em torno de seu “saber”, em torno de algo que, no final, é solenemente batizado como “a verdade”. (Para Além de Bem e Mal: § 2) Esta mesma que, com nossos preconceitos, negamos em dar vida.

Na dúvida deveríamos dar vida àquilo que nosso coração pede, e que nossa consciência nega. O outro pode ser mais parecido do que imaginamos alguma vez; ele pode ser, exatamente, o quê gostaríamos de ser! E nós, o quê gostaríamos de ser?

sábado, 30 de outubro de 2010

Aquém da Limitação Humana!



O tecnologismo é a fé pessimista escancarada,
é o sujeito sujeitado à sua mesquinez,
é o homem se projetando em seu sonho,
um sonho que ainda está a se fazer,
é o sonhar acordado,
pensando dormir sonhando,
pois, ao dormir, ainda é vida em pesadelo,
um pensamento a se construir no sonho do pesadelo,
pensando que o sonho é o sonho de outro
e que a vida é apenas um sonho de alguém.

É o verso embriagado de baba,
do nojo do vômito no chão sujando o esgoto,
mas é também o grito surdo à beleza seca,
ao luxo vazio com sua secura sub-humana...

É o escárnio ao escárnio petulante,
à linda necessidade de necessitar de alguém.

É a lama saindo das galerias a inundar os bairros nobres,
é a pobreza engolindo a riqueza que a criou,
mostrando a ela, a riqueza,
que não é mais possível fugir,
é, finalmente uma riqueza que não quer-se rica.

É a ciência que um dia, para ser ciência,
precisou ser apropriada,
precisou ser recriada,
e hoje... para continuar sendo ciência,
tem que ser socializada,
instrumentalizada por ela mesma,
legada a ela dentro de seu limite,
aquém da limitação humana!

Quebra de Página...


O impulso criativo, quando histórico, não apresenta nenhum sinal construtivo (isso se encararmos a construção como uma nova possibilidade de se pensar a criação), aliás, antes oferecesse uma situação destrutiva, pois, ao quebrar velhos ídolos está contribuindo com a inovação do prazer e a reconfiguração do saber, ou seja, automaticamente cria dentro do caos – dizem que o conhecimento precisa desta renovação e deste caos.

E por destruição, nada mais belo que a cena do caos criado a partir do pó e do concreto demolido; este mesmo caos que tem muito de vida e muito de novidade, e que corresponde a uma boa-nova estelar. Talvez seja esta novidade que estamos à caça, talvez seja esta estrela que falte à nossa constelação..., nem que para isso possamos ser ela própria a caça e não o caçador, pois, por caça há toda a floresta diante de nossa visão. Cá comigo, antes ser caça que não significar nada para este novo momento, principalmente quando temos uma mata bela e retumbante, espledorosa, sobre nossa estação...

A casa que poderíamos construir a partir desta destruição poderia, muito bem, ser o elemento novo para a construção; uma nova galaxia, plena de estrelas e novos astros. Pode até não parecer, mas o espírito, quando esbarra com o conhecimento, intimida novos caminhos, criando um monstro que, às vezes, cria algo do novo, de novo. Se este espírito não tivesse o conhecimento como elemento de transição, automaticamente, o passado seria nossa morada. Uma última guarita para os covardes.

Se a coragem é o elemento que garante a esperança, mais vale bater de frente com a justiça histórica e ser autêntico, que regressar ao elemento que enclausurou nossa virtude... e a virtude aqui tem muito de intromissão e complementação, jamais de exatidão. Assim, o virtuoso é aquele que consegue eliminar seu passado sem derrubar seu novo espírito.

E este passado, quando quebrado a marteladas, ainda que doa os dedos, alimenta o espírito da esperança, do futuro e da emoção... emoção com um pitaco de ilusão. Ilusão, com uma garantia de renascimento. Renascimento com o caos como gérmen. Um cadinho de esperança apenas garante futuro, um gérmen de esperança garante o futuro e alimenta o presente... eliminando muita poeira, limpando a história; tirando-a das mãos de homens imberbes, embora velhacos!

Quando por trás do impulso histórico não atua nenhum impulso construtivo, quando não se está destruindo e limpando terreno para que um futuro já vivo na esperança construa sua casa sobre o chão desimpedido, quando a justiça reina sozinha, então o instinto criador é despojado de sua força e de seu ânimo. (Da Utilidade e Desvantagem da História Para a Vida: § 7)

Queria que a força da destruição pudesse mostrar que o novo só pode ser construído com muita paixão e anelo. Este ânimo que se encontra além das forças humanas pode nos colocar bem ao lado dos deuses, equiparando-nos com algo que nunca fez parte de nossa vida, embora sempre estivesse em nossa vida. Este é nosso maior problema: sempre fomos gigantes, mas, por vários motivos, sempre nos colocamos sob os ombros deste gigante... quando é que nos colocaremos sobre o ombro destes gigantes?

Pergunta que fica para resposta posterior...

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Justiça ou Justiça Histórica?




Entre a esperança e a condenação, por justiça histórica, é preferível que a justiça histórica não exista, e que exista o respeito pela ilusão alheia; ainda que esta ilusão venha entremeada de sensores tortos... há que se pensar que, mais que ser um censor, deveríamos criar um universo de liberdade espiritual e sentimental.

Por outro lado, do ponto de vista da vida, é preferível que a esperança e a ilusão aconteça a todos, sem quaisquer retardos de censores. Resta saber, pois, de que forma dá para se pensar em justiça sem matar as esperanças. Ou ainda, pensar em esperanças sem que a justiça (e não a justiça histórica) seja deixada de lado, ao menos como ponto de referência, para uma possível averbação.

Em se pensando a justiça como uma senhora fria e cega, fica-se com a esperança e a ilusão de que sua cegueira não mate os sentimentos do pensamento vivo e vibrante (qualquer tentativa de fazê-lo, por si só, cria uma sensação de morte), este mesmo que é tão volúvel e, ao mesmo tempo, extremamente lascivo. Não quero, pois que a ilusão tenha um caminho torto, visto que os sentimentos humanos acabam necessitando de um limite, principalmente quando sabemos que este sentimento esteja travestido de valores; valores de outrora, valores criados pela poeira do tempo. Mas, acima disso, caso a lascívia ainda esteja por perto, melhor seria se ela pudesse intensificar nossas relações com os pensamentos e saberes de outrora.

Relacionarmo-nos com estes saberes pode nos colocar dentro do liame entre justiça e justiça dos homens (ou mesmo, noutro nome; justiça histórica). A justiça, esta última, é uma ciência fria, criada a partir de preceitos tortos, e são justamente estes preceitos que balizam o julgamento desta lascívia. A história, dessa forma, criou uma justiça com homens de outrora, será que o agora precisa desta passadez, ou necessita da criação de novos valores, logo, uma nova justiça? Este é o ponto que precisa ser pensado para que a justiça não maltrate as ilusões, algumas perdidas, de tempos e valores outros.

Em Da Utilidade e Desvantagem da História Para a Vida, Nietzsche ataca este ponto e nos cobra um posicionamento a respeito, fazendo-nos pensar um pouquinho sobre como o caminho se desviou. Algo que não deixe incólume os rigores da justiça humana, aliás, da justiça histórica; vejamos: O sentido histórico, quando reina irrefreado e traz todas as suas consequências, erradica o futuro, porque destrói as ilusões e retira às coisas sua atmosfera, somente na qual elas podem viver. A justiça histórica, mesmo quando é exercida efetivamente e em intenção pura, é uma virtude pavorosa, porque sempre solapa o que é vivo e o faz cair: seu julgamento é sempre uma condenação à morte. (§ 7)

O quê, então, há de tão pavoroso nessa justiça histórica? Simples, o fato de a mesma se basear em rigores constituídos valorativamente pelo tempo histórico, logo, pelo tempo forjado pelos homens de Lei, retirando dos homens de agora toda possibilidade de um outro futuro mais vibrante. Assim, a Tábua de Leis que dá respaldo a esta justiça é a mesma que obriga os valores e sentimentos humanos a se encaixarem na frieza da regra e na pequenez do tempo passado.

Se o sentimento tem algo de anelo, algo de fogoso, e até vibrante, suas ilusões podem carregar esta chama, o problema maior é você derrubar este anelo e apagar a chama, tirando do conhecimento toda sua persuasão vital, daí deveríamos encarar esta chama como algo que se encontra além da justiça histórica e ao alcance dos homens vivos e apaixonados... apaixonados pelo que a vida ainda tem a oferecer ao sentimento.

Primeira Postagem!


Que cada minuto seja o último...
que cada orgasmo seja o único...
que cada suspiro me lembre do anterior e do posterior...


Há tempos as palavras não brotavam assim...
há tempos as palavras não dançavam assim...
há tempos não fazia assim!


Alguns dias, alguns momentos,
poucas letras, dois instantes,
uma vida contada em dias corridos.


Voltam as palavras,
sacudam as letras,
dancem os números...


Estou de volta!

terça-feira, 26 de outubro de 2010

O Andarilho e Sua Sombra

O andarilho é aquele indivíduo que já alcançou a liberdade da razão, e quando ele consegue este feito, de forma automática, ele se torna senhor da razão, jamais escravo dela. O quê isso significa? Significa que, sendo eu senhor dela, sei exatamente o momento em que dela posso me utilizar, e quando ela posso me esquivar.

E por que chamar-me de andarilho? Andarilho é aquele que, da mesma forma que controla a razão, não faz dela morada fixa. Ele transforma sua vida numa andança em que a razão só serve para ser controlada, jamais perenizada. E por advir da vida, este andar dá intensidade à razão, automaticamente também ao saber; ao saber do conhecimento; ao saboroso prazer do saber. Este mesmo que pode ser encarado a partir de belas paisagens e de belas imagens, apenas vistas quando do andar devagar, do ruminar do ambiente. Do sorver a claridade do sol e as belezas que surgem de seu reflexo. Um reflexo pleno de vida e belo, tão-somente e por intensidade, pelo andar devagar.

Assim, quando atingimos a filosofia do meio-dia, ao longo deste constante caminhar, não permitimos que a sombra da razão nos influencie, nem nos cubra com sua escuridão obscena. Temos controle sobre esta sombra; ela está sob nossos pés, pois apenas ali ela aparece, pois o sol nos coloca no centro do mundo e sobre qualquer escuridão. O sol nos coloca no meio-dia da vida.

O andarilho que busca a filosofia do meio-dia não tem em seu projeto de caminhar um fim último, sua direção é a paisagem que a vida irá lhe mostrar. Há que ter os olhos abertos para tudo o que propriamente se passa no mundo, sejam eles os belos arvoredos que o acompanham em sua jornada, seja as sombras que serão subjugadas por seu espírito. Por isso ele tem uma bela e constante visão, tão plena e cheia de vida quanto deve ser a vida; uma vida sem sua submissão à razão.

Quem chegou, ainda que apenas em certa medida, à liberdade da razão, não pode sentir-se sobre a Terra senão como andarilho – embora não como viajante em direção a um alvo último: pois este não há. Mas bem que ele quer ver e ter os olhos abertos para tudo o que propriamente se passa no mundo; por isso não pode prender seu coração com demasiada firmeza a nada de singular; tem de haver nele próprio algo de errante, que encontra sua alegria na mudança e na transitoriedade. (Humano, Demasiado Humano, I: § 638)

Essa transitoriedade buscada pelo andarilho, e sua sombra, é a mesma que deveríamos buscar quando nos referimos ao conhecimento, especificamente o conhecimento advindo da vida. Aquele mesmo que é pulsante, belo e vivo. Aquele que nos dá vida e nos dá o controle sobre nossas sombras e sobre a grande sombra feita pelo sombreiro da razão.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

História Em Vida...

A vida precisa estar sempre comprometida com ela mesma, ou seja, sempre com a própria vida e nunca sendo conduzida por outrem. Assim, este compromisso tenciona trazer à vida mais vida, garantindo que ela se conduza a si mesma, construindo, com isso, uma maneira de se criar este vínculo – da vida com ela mesma – é a garantia e a conduta de sua existência, ou seja, a forma como levamos este compromisso.

A história, nesse sentido, pode ter grande utilidade e valia para que a vida se afirme a si mesma, visto que, nada melhor que contar à vida sua existência histórica e a maneira como este compromisso se daria neste tempo histórico.

Para que o fenômeno do conhecimento seja da própria vida ou da história desta vida ele não pode ser, nem se apresentar morto, pois isso não garante utilidade nenhuma à vida e ao conhecimento em si mesmo. Já, por outro lado, um fenômeno pulsante e vivo passa a ser melhor utilizado por esta vida como uma referência de conhecimento a posteriori. Além do mais, a potência deste fenômeno está justamente na pujança da vida e sua pulsante existência.

Para que a história não encerre a vida nela mesma, fazendo-a perecer, ela necessita de um fluxo muito forte e constante, ou noutras palavras, um fluxo vivo e pulsante. Vejamos, pois, como isso se daria: A história pensada como ciência pura e tornada soberana seria uma espécie de encerramento e balanço da vida para a humanidade. A cultura histórica, pelo contrário, só é algo salutar e que promete futuro em decorrência de um poderoso e novo fluxo de vida, por exemplo, de uma civilização vindo a ser, portanto somente quando é dominada e conduzida por uma força superior e não é ela mesma que domina e conduz. (Da Utilidade e Desvantagem da História Para a Vida: § 1)

Sua condução, portanto, seria o próprio fluxo da vida: um olhar no passado com uma visagem ao longe. Uma condução pura e simples do que é a vida e de como a história pode ser benfeitora dessa vida viva e pulsante. Se há um compromisso com o tempo, que seja com um tempo vivo, um tempo que não esteja coberto de poeira!

domingo, 24 de outubro de 2010

Ah!!... O Conhecimento!

O conhecimento, quando referendado, pode ser punido, e a paixão pelo conhecimento acaba sendo o ponto de referência para essa punição. Resta saber a quem convém essa punição... será que ela convém a quem pune ou a quem é punido? Não sei responder, com uma pergunta questiono o seguinte: até que ponto o que coloco na mesa tem a ver com a realidade que está ao redor da mesa?

Não sei, o quê sei é que, caia a humanidade, mas viva o conhecimento: Talvez mesmo a humanidade sucumba por esta paixão do conhecimento! – nem mesmo este pensamento pode nada sobre nós! (...) O amor e a morte não são irmãos? Sim, odiamos a barbárie – preferimos todos ver sucumbir a humanidade a ver regredir o conhecimento! E, por fim: se a humanidade não sucumbir por uma paixão, ela sucumbirá por uma fraqueza: o que se prefere? Essa é a questão principal. Queremos para ela um fim em fogo e luz ou em areia? – (Aurora: § 429)

Se o fogo vem como Fênix e a luz vem como Prometeu, a areia, em momento algum, nos passa de forma concreta..., aliás, nos passa pelos dedos; o que traz um problema ainda maior: segurar o quê? Sei não, se não tem o que segurar, ao menos temos um ponto para nos fixarmos: que viva o conhecimento e que pereça a humanidade!

Apenas assim poderemos ter garantia de que o conhecimento, mesmo com um cataclismo global, não perecerá!

sábado, 23 de outubro de 2010

Mais que Paixão!

Sacrifício e paixão: duas palavras que significam muito mais que o conjunto de algumas letras. Mais que letras, sentimentos... e é justamente neste ponto que o espírito cria condições para se desenvolver; nem que para isso tenha que criar algo aquém do já posto... e por posto temos uma vida fora de nosso ser.

Se queres que o ser tenha condições de exercer sua paixão, saiba que, além de ser, há o existir, e apenas existimos quando temos tempo para dizer ao mundo que nossa existência não depende do mesmo. Nossa existência depende unicamente de nossa paixão em se fazer acreditar. Se eu acredito que posso existir, mais que uma paixão, estou tendo uma constatação. Afinal de contas: quem garante minha existência?

Se há algo a temer, que não seja o medo de viver e de se apaixonar. Eu quero me apaixonar pela vida, e garantir a esta minha nova vida uma condição de vida em abundância. Vejamos, pois, como esta abundância pode redundar noutro ser... não que eu queira isso, mas sei que meu espírito enseja isso; com todas suas condições de existência: aliás, sua vida depende deste desejo.

O conhecimento, em nós se transmudou em paixão, que não se intimida diante de nenhum sacrifício e no fundo nada teme, a não ser sua própria extinção; acreditamos sinceramente que toda a humanidade, sob o ímpeto e o sofrimento dessa paixão, teria de se acreditar mais sublime e consolada do que até agora, quando não havia superado a inveja pelo bem-estar mais grosseiro que acompanha a barbárie. (Aurora: § 429)

Gostaria, realmente de ter condições de fazer de meu bem-estar um mal-estar, pois só assim teria condições de sentir-me incomodado com a vida e, com isso, criar um caminho saudável para minha paixão e sua concomitância ao espírito que gostaria de ressuscitar, nem que para isso o Frankenstein venha junto!

O conhecimento precisa de partes alheias...

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Aurora


O impulso ao conhecimento, como qualquer outra paixão, não pode ser controlado, pois isso feito, nosso feitio cria nova roupagem e garante algo que não nos pertence, por isso, imagino que a integridade do ser seria justamente a repulsa a modos alheios e o tesão a modos próprios, visto que o não-feito pode ser melhor compreendido que o feito já posto.

Dessa forma, a força de nossa vida pode ser comparada e mensurada sobre a força que exercemos sobre nossas paixões, criando um invólucro protetor para que nossas paixões não nos deixe em apuros. Quero crer que nossas paixões só são fortes porque minha (nossa) vida está acima de meros receptáculos de memória.

E assim, amar a vida seria transmutar paixão em tesão e sangue, oferecendo-nos o gozo do paraíso, e esta força só se mostraria, em paraíso, quando nossa memória se encontra aquém destes receptáculos. Nossa vida, nossa paixão, e todo o entorno elementar desta celeuma, poderiam criar uma destexturização de nossa identidade, dando-nos uma nova possibilidade de compreender o mundo sem que o mesmo nos engula, por isso, imagino que isso pode ser útil quando nossa identidade estiver recoberta pela poeira do tempo, e a história contaminada pelo vício dos homens.

Voltando ao ponto principal: o impulso ao conhecimento, e somente ele, é o responsável por esta nossa nova possibilidade de vida...; resta saber se nossa vida está aberta a essas novas possibilidades...

O fato é que nosso impulso ao conhecimento é forte demais para que ainda sejamos capazes de estimar a felicidade sem conhecimento ou a felicidade de uma ilusão forte, firme; é penoso simplesmente representarmo-nos tais estados! A intranquilidade do descobrir e adivinhar tornou-se tão atraente e indispensável para nós quanto o amor infeliz para aquele que ama (...). (Aurora: § 429)

Infelizmente (ou felizmente, depende do ponto de vista), amar de forma infeliz pode ser o melhor remédio para sairmos do engano e reconhecermos, realmente, qual o futuro que queremos para nós!!!

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Sob o Pó do Tempo...

A história é legitimada a partir do retrocesso, não que isso signifique um retorno ao obscurantismo, mas um retorno de fato, ou seja, um retorno a tudo aquilo que está posto sobre a mesa, colocado sob a poeira do tempo e encoberto pela ignorância de nossos antepassados. Assim, tudo isso passa ser repensado, revisto e redescoberto, principalmente do ponto de vista psicológico. É como se tivéssemos a possibilidade de andar alguns degraus para trás, para vermos o que nossa sombra (e a sombra do mundo) encobriu.

Velhos valores, velhos conceitos e velhas ideologias devem ser pensados como realmente são, isto posto, apenas uma certeza; coisa velha! Seu pó (o pó do tempo) há muito encobriu velhos saberes e até mesmo velhas verdades, por isso mesmo somos tão cheios de preconceitos, embora, muito donos de si. Nesse sentido, o fato de sermos donos de si, pensando sob esta forma retrógada, é bem diferente do ser dono de si, com olhares para adiante. Com olhares de ruminação...

Apenas pensando para trás ultrapassamos preconceitos e medos (preconceito do que está aí posto, medo do que se coloca, adiante, diante de nossos olhos), recolocando saberes e valores no trilho novamente; aqueles encobertos pela poeira da estrada. E quando nos dispomos a largar destes vícios, nos dispomos a olhar o futuro com bons olhos (e com outros olhos)... e esta sensação é o começo de uma nova visão de mundo.

Como por exemplo no aforismo de Humano, Demasiado Humano: (...) em seguida é necessário um movimento de retrocesso: ele tem de compreender a legitimação histórica, assim como a psicológica, de tais representações, tem de reconhecer como a máxima promoção da humanidade veio de lá e como, sem esse movimento de retrocesso, nos privaríamos dos melhores resultados conseguidos pela humanidade até agora. (§ 20)

O movimento de retrocesso, dessa forma, acaba causando em nosso espírito uma nova oportunidade e um novo olhar. Um novo olhar que nos coloca aquém de tudo aquilo outrora, por nós, passado, e dentro de algo novo, por nós passado mas, ao mesmo tempo, não-visto de forma plena e distinta. Uma nova oportunidade que nos dá, também, uma nova chance de corrigir os erros de nossos antepassados.

A necessidade de se encobrir nosso espírito de história nos dá uma segunda chance para um novo passado, embora, um novo passado já vivido, porém, pouco sentido...

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Como Um Regurgito!

A prontidão com que as coisas se apresentam, todos os dias, em nossa vida, a força do conhecimento, o ir e vir constante das várias informações que, diuturnamente, somos bombardeados... tudo isso, acaba nos colocando numa situação extremamente complicada: até que ponto todas estas informações, toda essa gama de conhecimento são úteis e saudáveis para nosso espírito? E como temos digerido este alimento?

Imagino que, informação em excesso é o primeiro sintoma de que alguma coisa está errada em nosso organismo, a não ser que tenhamos tal comida como algo a ser regurgitado, jamais defecado, pois todo conhecimento necessita de um tempo de maturação, e esta maturação pode vir de uma forma bastante enigmática; quando isso não acontece, o que nos chega, mostra-se como algo ilusório e extremamente enganador, com mal cheiro de fezes.

Por outro lado, toda essa gama de informação que, por assim dizer, surge da ignorância e da pressa em não nos atermos a nada com uma força arbitrária extremamente coercitiva, pode ser também o ponto de partida para algo novo e ruminador. Isto é, estas informações arbitrárias, para virarem conhecimento, necessitam de um tempo de gestação, ou mesmo de transformação; e um exemplo bom disso é o ruminar da vaca.

Um alimento que é engolido no início do dia, com uma pressa voraz e desesperada, lá pela metade do dia, acaba voltando como um bolo estomacal e tal como um quase-vômito, passa a ser mastigado, pelo resto do dia, pela boca destes ruminantes. Bom começo este.

Vejamos, pois, Nietzsche em Para Além de Bem e Mal discorrendo a respeito, e pensemos um pouco: (...) uma satisfação com o escuro, com o horizonte exclusivo, um dizer-sim e aprovação à ignorância: tudo isso necessário segundo o grau de sua força de apropriação, de sua “força digestiva”, para falar em imagem – e efetivamente o “espírito” ainda se assemelha ao máximo a um estômago. (§ 230) Esta vontade de se deixar enganar, com tanta informação, quando digerida e ruminada; surge da ignorância e se transforma numa das mais nobres formas de pensar: o pensar-diferente, apesar deste pensar vir através de uma aparência não mui agradável.

Em que medida temos feito isso, com tanta informação concebida e digerida? Será que estamos apenas digerindo e defecando, não permitindo que o vômito nos dê uma segunda oportunidade de ruminarmos tais informações? Vale a pena tentar este vômito...

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Grandeza do Espírito


A força do espírito, como força de lei, passa a olhar o mundo como um preço a ser estipulado e uma conquista a ser valorada, preza-se com isso o poder imperioso de fazer o espírito brotar numa semente genuína onde os valores de outrora apenas compõem o mosaico do porvir. Com uma liberdade intimamente ligada à propensão de dominação e à reavaliação da vida. É como se o forte voltasse a exigir seu poder e domínio de volta, é como se o fraco fosse preterido em detrimento de uma revolução.

Estes espíritos imperiosos que vez ou outra surgem no mundo nada mais desejam que reivindicar seu trono de volta, é como se um trono, há muito perdido, fosse novamente requisitado..., pelo simples fato de não ter sido tomado por ninguém, mantendo-se vazio à espera deste dono sempiterno. Um dono que sempre esteve por perto, contudo, apenas olhando de forma distante.

O grande risco que surge deste controle são as mãos que o toma. Até que ponto há um espírito tão valoroso capaz de reivindicar de volta isso, sem que suas pretensões sejam engano de um ser fraco e voluntarioso?

O que poderia ser alheio passa a ser meio para um fim mais valoroso e nobre, para uma vida mais aberta ao novo e ao distinto... ao contraditório até. Não que se justifique qualquer ação, mas que se constitua uma revolta interna capaz de alimentar esta semente em plenos valores de germinação, uma semente que com sua seiva bendita traga novos e nobres espécimes. Assim, sua galhardia só se confirma conforme os atos então justificáveis e justificados, com gérmens cada vez mais belos e sempre-tenros.

Se nalgum momento um espírito como este surge das entranhas de nosso ser, como outrora, precisamos de tais vísceras e de sua abnegação com o velho, além de tão belos valores quanto a força que deles, como broto novo, surgira. Há que se valorar aquilo que o ser concebe como mais profundo; de tábula rasa o mundo está cheio de pretendentes ao trono, e nenhum espécime capaz de domá-lo.

Em Para Além de Bem e Mal, um aforismo é bem detalhado no que se refere à esta revolução, aliás, a esta revaloração, vejamos: A força do espírito em apropriar-se do que é alheio revela-se em uma forte propensão a assimilar o novo ao velho, simplificar o diverso, passar por alto o inteiramente contraditório ou descartá-lo: assim como arbitrariamente sublinha mais forte, destaca, falsifica para seu uso determinados traços e linhas no que é alheio, em cada pedaço de “mundo exterior”. Seu propósito, nisso, é a incorporação de novas “experiências”, a inserção de novas coisas em velhas séries – crescimento, portanto; mais determinante ainda, o sentimento de crescimento, o sentimento de força aumentada. (§ 230) A força que deste novo irrompe deve entrar naquilo que está carcomido e revigorá-lo dentro de uma nova roupagem que, por sua vez, cria novos brotos.

Este novo não pode ser pensado de forma aventureira, mas de forma revigorante e premente (com uma constância quase sagrada), o que garante o surgimento da força do espírito num universo outro. O que garante uma constância jamais igual ao posto anteriormente... uma constância de algo sempre novo e nobre!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Da Superação de Si Por Meio das Vísceras



Quando se trata de conhecimento o importante é não se envergonhar de fazermos o que nossa vontade manda, em especial quando este conhecimento surge de nossas vísceras, a elas se volta e depois se translitera para o mundo. Nesse sentido, esta última parte que parece ser a mais complicada, visto que, tudo aquilo que sai das vísceras de alguém pode não parecer belo aos olhos, muito menos ao coração. Eis que é neste ponto quando damos o salto de autonomia.

E por autonomia, nada melhor que a transgressão, ou seja, se pensar é transgredir não estaria eu transgredindo algo que faz parte de minhas vísceras, estaria apenas sendo autêntico aos meus princípios, mesmo sabendo que estas minhas vísceras não fazem parte do senso-comum. O mesmo senso-comum que se nos apresenta a partir da tábula rasa dos saberes instituídos. Não que eu vá negá-los; apenas algo que faço (essa negação) para afirmar outrem.

O que minhas vísceras são, passam ao jugo do coletivo a partir do momento em que elas vêm à tona, deixando de ser minhas, mas identificando-me a algo, garantindo uma identidade própria. Eis o tomo da coisa: nossa vida só vira livro de vários tomos quando a publicamos, daí a necessária exposição.

Em Assim Falou Zaratustra, livro II, vemos o seguinte: E então se envergonha vosso espírito de fazer a vontade de vossas vísceras, e se esquiva de sua própria vergonha por vias de dissimulação e mentira. (Do Imaculado Conhecimento) Este seria o ponto, como dissimular aquilo que nos convém de mais legítimo? Envergonhar-se de saberes distintos pelo simples fato de não serem convencionais? Que tipo de pessoas estamos sendo ao agirmos dessa forma?

Uma outra leitura interessante vem logo antes: Com vossos valores e palavras de bem e mal exerceis poder, ó estimadores de valores; é esse o vosso amor escondido e o esplendor, estremecimento e transbordamento de vossas almas (...) (Da Superação de Si), ao nos superarmos a nós mesmos estamos deixando nossas vísceras expostas, estremecendo o meio no qual colocamos nossa exposição, e o importante dessa exposição é justamente a demonstração do que somos capazes, e o esplendor desta capacidade oculta, embora sempre presente; isso se chama amor próprio... eis uma boa dica!

domingo, 17 de outubro de 2010

Ler Para Crescer


Entender o que se diz, seja de forma escrita, seja de forma oral, seria talvez, a mais nobre de todas as artes, especialmente em momentos tão tenebrosos como os que estamos vivendo, onde o dito pelo não-dito acaba sendo a mesma coisa – com a mera intenção de se angariar algumas almas incautas para um futuro de luxo pelos próximos quatro anos (ao menos). Poderia ser uma superstição, mas a Idade Média nunca esteve tão próxima dessa nossa era que chamamos Era da Informação. São ilimitados os recursos, no entanto, são limitadíssimas as pessoas que destes recursos se sobrelevam... que criam e olham adiante.

Afora, mais limitada ainda é a condição que as pessoas têm de conceber tais informações... para alguns são apenas letras miúdas que brincam com nossa tíbia visão, para outros um estorvo à correria e ao imediatismo “adolescil” de nossas imberbes cabecinhas. Nesse contexto, uma ciência tal como a Filologia nunca fora tão importante como pode ser nos dias de hoje, principalmente quando queremos conceber o mundo fora da consciência tabula rasa da política atual; aliás, da politicagem atual, trazendo para nossos espíritos uma elevação inteligencial jamais vista.

Em Humano, Demasiado Humano vol. I, Nietzsche dirá: (...) a Idade Média inteira era profundamente incapaz de uma explicação rigorosamente filológica, isto é, do simples querer-entender aquilo que o autor diz – foi alguma coisa encontrar esses métodos, não o subestimemos! Toda ciência só ganhou continuidade e constância quando a arte da leitura correta, isto é, a filologia, chegou a seu auge. (§ 270) Quando a boa leitura se dá de uma forma ruminosa, mais lento e sensível é o sabor das belas letras. Infelizmente, mesmo tendo tantos recursos nunca ficamos tão burros como estamos nos tornando.

Ao nos acostumarmos com más letras estamos abrindo mão de um direito conquistado a mais de cinco séculos, retrocedendo a um tempo em que o saber, tão-somente, poderia ser saboreado por lu$trosas mãos... se voltar no tempo é o que essa molecada quer, que façam sozinhos!

sábado, 16 de outubro de 2010

Sonho de Ícaro


As torres de uma cidade, tal como o panóptico de Foucault, servem para vermos das alturas, sem que possam nos observar. Por isso, olhando de lá, sinto que o caminho, e sua estrada, foram traçados unicamente para podermos, como ovelhas, depositar nas urnas dois dígitos, sem ao menos sabermos o que significam tais dígitos. Que números posso lá digitar? Uma pergunta que não convêm a mim, e sim àqueles que aqui lêem estas letras.

Anteriores ou vindouros, o quê colocamos nas urnas não passa de meros dígitos, longe da representação que outrora tivemos... aliás, uma representação que nunca tivemos: como representação de si nos resta o número de alguém, com uma plataforma de ninguém, que não tem nada a ver comigo, nem contigo!

Uma forma de sabermos o tamanho deste panóptico seria, justamente, ir o mais distante possível dele. Visto de longe; de longe colocaríamos nosso pastoreio e, menos ainda, seríamos contaminado por tal doença... mesmo sendo, nós, os fortes da história.
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Preconceitos morais seriam meramente momentos de consciência fora de nós, ou, pensando no coletivo de nosso povo: algo que acontece em todos aqueles que a má doença tomou conta. Nossa consciência só se constitui quando dela nos despimos... tal como, atualmente, nos vemos e nos vêem... vêem a gente como se nós tivermos vendo-os! Mas, o quê gostaríamos de ver?.

Uma solução? Certamente aquela colocada por Nietzsche em A Gaia Ciência: “Pensamentos sobre preconceitos morais”, caso não devam ser preconceitos, pressupõem uma posição fora da moral, algum além de bem e mal, ao qual é preciso subir, galgar, voar (...)(§ 380), vemos aquilo que os preconceitos querem nos mostrar... Se quisermos galgar além disso, com certeza, precisamos tirar da estrada a asa que nos coloca junto à Ícaro...!.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Receptáculo de Doenças!


Entre ser doente e ser forte pode-se dizer que o caminho acaba sendo o mesmo; o doente é aquele que, por um motivo ou outro, saiu do caminho que a saúde lhe traçou, já o forte sai do caminho que a mediocridade o aprisionou. Ambos têm um caminho já traçado pelo traçado da consciência coletiva e do bem-estar social. Ambos podem se colocar fora deste alcance maquiavélico, resta saber qual dos dois, em seu estado de espírito distinto, pode ser considerado o mais nobre dos seres no universo dos seres sociais.

A certeza de que a vida está presente em nossa vida é justamente aquela das duas situações sentidas dentro dela, todavia, acima dela. A consciência que era para entrarmos é a mesma estrada que estamos seguindo por traçado prévio, sem dela nos retirarmos. Quem o traçou já não sei dizer, mas sei dizer que o traçado pode ser conhecido (por estes pastores)... são coisas que apenas ao mistério convêm. Quem, de nós, seria então o predestinado para apresentar o traçado sem dele se utilizar? Uma pergunta que depende da doença e da força, nesta estrada conduzida por doentes e fortes.

Infelizmente cabe ao pastor, ou ao padre ascético, o papel de desta estrada nos conduzir (ao menos àqueles que gostem do caminho ou não se comportam como doentes, ou fortes), visto que são eles os responsáveis por conduzir o rebanho, impedindo um possível desvio, sabendo que são, com exatidão, eles os conhecedores destes espaços.

Novas palavras de Nietzsche, em Para a Genealogia da Moral (III, § 15) para esta nossa prece diária, visto que, desde as últimas palavras, é dele que subtraímos outras palavras, e nada melhor que de sua boca ouvirmos palavras de pastor: Ele próprio [o pastor] tem de ser doente, tem de ser aparentado desde o fundamento aos doentes e enjeitados, para entendê-los – para se entender com eles; mas tem também de ser forte, mais senhor ainda sobre si do que sobre os outros, ileso, em especial, em sua vontade de potencia, para ter confiança e o medo dos doentes, para poder ser para eles amparo, resistência, esteio, coação, mestre de disciplina, tirano, Deus. Espaços que podem ser de muita valia para os vários buracos a preencher.

Sua força e sua vontade estão justamente em saber, de forma exata, qual é o estado da doença, para dela se utilizar, subjugando-a (a doença) como forma de conduta e comando. E por isso ele é muito forte, ainda mais que todos os outros que andam pela estrada sem reclamar; forte, porém relicário de sua liberdade – uma espécie de placebo para os hipocondríacos que seguem pela estrada.

Há que se valorizar os Sísifos que desta aventura se dispõem, obrigatoriamente, a levar grandes rochas para o cume da montanha. Sua força está em saber o caminho, mesmo se passando por um comum e reles moribundo. Mesmo sabendo que todos estão carregando rochas, sem o saber...

Sabe-se, contudo, que o sofrimento destes pastores nem se compara aos sofrimentos de suas ovelhas. Antes sofrer, sabendo fazê-lo, e disso criando uma cura, que sofrer sabendo fazê-lo como uma doença..., uma doença que o pastor é o próprio receptáculo!

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Tomar Consciência ou Viver Sem Ela?


A consciência passa a ser elemento importante quando dela nos despimos, por um motivo ou outro, deixando de utilizá-la, seja por conta dos percalços da vida, seja por conta da exorbitante obrigação de viver em sociedade, como também de viver sem ela. Uma forma de viver, realmente especial e que está totalmente equiparada com nossas obrigações sociais e todo o conjunto de signos que os vários momentos do presente se nos apresentam. Apreciar isso com olhos de douto é coisa para poucos, principalmente com olhos de suspensão e suspeita.

Em dias como os que estamos vivendo, passando por um momento de eleições e também de várias incertezas com relação ao que virá a partir do ano que vem, paramos para analisar as mazelas que este momento se nos apresenta. E por mazelas nada a ver com desenvolturas sociais e a total incompreensão do Ter e do Ser. Riqueza não pode ser algo apenas material, tem que o ser ligado intimamente com o psicológico. E é neste ponto que nos falta o essencial: discernimento para podermos compreender o que realmente está acontecendo nestes momentos que antecedem o dia 31.

Muito se falou da hipocrisia política de nossos dois candidatos, principalmente no que se refere à hipocrisia discursiva, com o simples intento de arrebanhar algumas (milhões de) ovelhinhas... no papel, aliás dentro do papel, a tudo se pode e a tudo existe, resta saber se esta discussão sairá, aliás, passará do dia 31... penso que não, e é isso que mais incomoda!

Isso me faz recorrer a uma, de tantas, frase de Nietzsche no A Gaia Ciência: O problema do ter consciência (mais corretamente: do tomar-consciência-de-si) só se apresenta a nós quando começamos a conceber em que medida poderíamos passar sem ela (...), eis o ponto; quantos são os que têm essa consciência de que, de fato, está de apossando dela? Ou perdendo-a, por um motivo ou outro? Quantos poderiam ler esta magnífica frase e compreendê-la, tomando consciência dela? Está aí mais um momento sociopolítico que nos faz refletir sobre... nos faz a quem? A quem poderíamos nomear esse nos?

Seguindo adiante nesta bela frase nietzschiana: (...) Poderíamos, com efeito, pensar, sentir, querer, recordar-nos, poderíamos igualmente “agir” em todo sentido da palavra: e, a despeito disso, não seria preciso que tudo isso nos “entrasse na consciência” (§ 354). Dá para colocar tanta coisa na consciência, entrando dentro de seu turbilhão de seres e saberes se é ela que nos surpreende quando nos damos conta das mazelas psicológicas que orbitamos todos os dias, principalmente em momentos especialmente conturbados, e pleno de informações e desinformações, tais como esse? Não sei, deixo aí algumas palavras... e que possamos voltar a elas depois...!